Durante horas, dias, recordei os momentos que passamos em comum. As minhas memórias rebobinaram tantas horas intensas de treino, de jogo, de suor, sorrisos, festejos, tristezas, abraços fortes e, acima de tudo, de amizade. Na verdade, as histórias maravilhosas que ficam da prática desportiva de competição.
As conversas hilariantes que nos assolam a memória e nos fazem esboçar um rasgado sorriso. As peripécias que só podem acontecer no lugar sagrado de qualquer equipa: o balneário. Os saltos, os abraços, a corrida à volta do campo, o orgulho de blocar o adversário. Fizemos tantos, intransponíveis.
A inocência da alegria, de jogar, como se não houvesse amanhã. Momentos únicos que perdurarão na memória de quem os viveu, mas que são tão intensos, que ficam gravados de forma profunda em qualquer um de nós. De repente a memória ficou árida, silenciosa e vazia. A saliva desapareceu da boca. A tristeza ganhou vida e as minhas recordações, não podem ser mais partilhadas, com um dos atletas e um dos amigos que mais me marcou.
Por ser de Braga, por ter iniciado no mesmo clube que eu, por amar a mesma modalidade, por termos partilhado tantos e bons momentos, do mesmo lado da rede, em lados opostos, mas acima de tudo, pela amizade que nos fez comungar tantos e tantos momentos, muito para além dos campos e dos pavilhões.
Quem pratica um determinado desporto, partilha uma sensação de pertença, como que de orgulho de uma qualquer Tribo, em que o privilégio de estar e ser são tão intensos, como os momentos que esse desporto nos pode proporcionar. Eu fui um dos atletas, que teve o privilégio de jogar contra muitos jogadores, de jogar com outros, que em anos anteriores jogavam do outro lado da rede, e que noutros comungavam comigo o desafio de defender as mesmas cores.
Nos dias seguintes ao inesperado e infausto acontecimento, não consegui, deixar de parar de pensar, intensamente, no enorme coração e caráter deste meu/nosso amigo, atleta, voleibolista. Da dor que a sua família estava a sentir. Se a minha dor estava a ser grande, difícil de aceitar, não consigo imaginar como seria a dor da sua família. Não consegui deixar de ter uma sensação de perda de uma figura marcante do voleibol em Braga, em Portugal. Uma figura tão grande, imponente e bruta, como proporcional à imensidão da sua lealdade aos seus companheiros.
Apesar de te terem privado de viveres uma vida longa, podemos dizer que, aquela que tu viveste, e que tive o privilégio de me cruzar contigo e partilhar tanta coisa, teve sentido e foi, provavelmente, mais intensa, humorada, do que muitas outras. Não foi em vão. Apenas, não conseguiste blocar essa maleita tenebrosa.
Com um sentimento único de uma amizade muito maior que as palavras, fica aqui uma pequena e singela homenagem, à figura desportiva, ao Homem, ao bracarense e ao amigo. Tive o privilégio de juntar uns amigos, que conviveram conjuntamente connosco, e fizemos um brinde à tua memória. Celebramos o que nos proporcionaste. Obrigado Rui Leite.
As cinzas que as chamas intensas da saudade nos deixam, vão-se transformando, muito lentamente, num sentimento de celebração da vida e das memórias que nos deixaste.
Autor: Carlos Dias