O governo enfrenta, de há tempos a esta parte, uma agitação e contestação públicas crescentes nos serviços e nas ruas; e este movimento social que tenta alastrar tem a sua génese na luta por melhores condições de vida, mormente laborais e salariais.
Concretamente os setores que se destacam e mais preocupam os portugueses são a Saúde e a Educação; e claramente se constata que os protestos sobem de tom, no caso da Saúde, vindos de administradores hospitalares, de médicos, de enfermeiros, de auxiliares, de sindicatos e de utentes e no da Educação tendo como protagonistas diretores de escolas, professores, pais, assistentes operacionais e sindicatos.
A resposta do governo a esta contestação, por parte das respetivas tutelas, em nada tem ajudado ou contribuído para sanar os problemas que estão na causa de tais
movimentos; e, até, os tem exacerbado o que, à partida, ou revela desinteresse do governo ou incompetência dos respetivos ministérios.
Relativamente aos problemas que acontecem na Saúde, centrados no SNS (Serviço Nacional de Saúde), onde os meios humanos e materiais se encontram em rotura, a ministra Marta Temido vai chutando para o lado com muito blá, blá, blá e nenhuma solução à vista; apenas no que à escassez de meios humanos concerne, aventa a hipótese, para colmatar a falta de médicos, de obrigar os recém-formados à vinculação, ainda sem regras definidas, nos hospitais públicos e centros de saúde; e o argumento que invoca para tal é o de, assim, tais médicos compensarem o Estado pelos gastos que teve na sua formação; obviamente, uma medida sem pés nem cabeça, dado que tais profissionais já pagaram durante a sua formação o que lhes foi faturado; e se este princípio fosse avante, então, todos os licenciados nas universidades públicas teriam de ressarcir o Estado pelas despesas feitas com a sua formação.
Depois, o SNS confronta-se com a concorrência apertada e cada vez maior dos hospitais e clínicas privados, aonde acorrem os doentes, sobretudo com seguros de saúde que atualmente sobem em flecha ou que se confrontam com as enormes listas de espera para consultas e cirurgias na maioria dos hospitais públicos; e, dada esta procura dos serviços privados, a necessidade de médicos, enfermeiros e técnicos aumenta nestas unidades o que faz com que estes profissionais abandonem o SNS e procurem os hospitais e clínicas privadas, onde usufruem de melhores condições de trabalho e remuneração; e isto tem provocado o caos e carências de toda a ordem no SNS.
Por outro lado, na Educação, embora noutra dimensão e perspetiva, os problemas que já vêm de longa data, ultimamente se agudizam, dado o abandono a que o ministério tem votado este serviço público; e o mais grave é a falta de valorização e investimento com que tem sido tratado o setor, mormente no que aos recursos humanos e materiais diz respeito; e isto, sobretudo, se repercute na falta de professores para responder às exigências das escolas e do ensino/aprendizagem, bem como na de pessoal auxiliar; e esta situação obriga os pais a levarem os filhos para o ensino privado.
No que diz respeito à falta de professores ela fundamenta-se nas difíceis condições de contratação e trabalho que eles enfrentam e nos vencimentos que auferem; por exemplo, há muitos professores que fazem diariamente centenas de quilómetros para chegarem às escolas e muitos outros têm de abandonar a sua residência permanente para alugarem outra durante um ano; ora, ao preço a que está a habitação e o custo de vida, estes profissionais são obrigados a fazerem das tripas coração para cumprirem as suas obrigações e muitos deles abandonam definitivamente a profissão, pois, em tais condições, não conseguem sobreviver.
Todavia, o ministro Brandão Rodrigues parece indiferente aos problemas do seu ministério e tenta passar a mensagem de que tudo vai bem e a culpa é dos sindicatos que mais não são do que um bando de agitadores; e se, um dia, pensar fazer aos professores o que a ministra da saúde quer fazer aos médicos, a sua fuga ainda será maior do que atualmente; e, além disso, quer na Saúde, quer na Educação este abandono forçado dos respetivos profissionais dará lugar ao recrutamento de médicos e professores sem as necessárias condições de formação para garantirem serviços de qualidade suficientes: e, assim, podem tais ministérios terem de recorrer, perante uma emergência absoluta de escassez de meios humanos, à promoção de enfermeiros a médicos e de assistentes operacionais a professores, dando-lhes uma formação acelerada, como, noutros tempos, já aconteceu com a promoção, através de uma ensaboadela de pedagogia e didática, de regentes escolares a professoras, quando o sistema de ensino se confrontou com falta de profissionais legalmente habilitados.
Em conclusão, os tempos mudam e as exigências da vida mudanças requerem e sempre para melhor; e isto parece que o primeiro-ministro não entende ou quer entender, deixando as coisas rolarem por si sós e ao sabor das circunstâncias.
Pode ser, todavia, que o povo acorde de vez para a realidade e, começando a pensar com sua própria cabeça, como há muito o devia ter feito, deixe de se embalar nas tretas de certos políticos e exija e lute para ser ouvido e atendido no que aos seus direitos constitucionais diz respeito.
Então, até de hoje a oito.
Autor: Dinis Salgado