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Caminhando isolado para o mundo

A pandemia que o mundo vive reporta-nos a outras crises de natureza diversa, bélica, económico-financeira, sanitária e de outra índole, verificados no passado longínquo ou recente. Todas elas são marcantes na forma de surgirem, de se desenvolverem e trazerem consequências que sempre afetaram as nações, nas relações intercomunitárias, na génese da sua origem, assim como provocaram, muitas vezes, sérias consequências nos regimes e nas ideologias políticas, com modificações profundas na governação e nas formas de atuação, originando, quantas vezes, o passar de uma democracia estruturada para ditaduras musculadas, sem liberdade ou ideológicas populistas. Atravessa a humanidade uma pandemia transversal a todos os continentes, que vai afetar a vivência inter-nações, pois vai provocar situações gravosas na economia, no desemprego, originando maiores desigualdades, afetando severamente as famílias e os que vão ser atingidos pelo desemprego, provocando um futuro pouco promissor para os jovens, face às dificuldades na sua formação e futuro profissional. Mas tem sido nestas situações emergentes, através de séculos, que os portugueses têm mostrado a sua fibra e visão para prosseguir o caminho com perseverança, otimismo e esperança, palavra esta tão cara ao Papa Francisco. Felizmente que, num mundo conturbado e desumanizado, face às novas tecnologias, à desestruturação familiar, em que os valores e princípios são desvalorizados, surgem exemplos que vão marcar uma época, permitindo repensar e meditar no futuro. Esta confinação imprevisível vai provocar algumas consequências psicológicas, resultantes do isolamento, ocasionando uma forma diferente de pensar o futuro e a sua evolução. Independentemente do momento político e da governação do país, é nestas ocorrências que a unidade e a coesão se deve evidenciar no sentido de haver decisões abrangentes, procurando melhores soluções para ultrapassar esta crise pandémica, com consequências económico-financeiras imediatas e a curto prazo, indo de encontro a decisões ajustadas a cada momento, sem oportunismo político, que pode subverter um contexto humanístico. Portugal é um país maioritariamente católico, dentro de um Estado oficial laico, mas isso não impede os valores cristãos, assim como outras religiões, indo de encontro a um ecumenismo, reconhecido em liberdade democrática, dentro dos direitos dos cidadãos, e não ao sabor das ocasiões e das oportunidades para projeção governativa ou partidária. A Igreja Católica e outras religiões foram exemplares na forma como encararam o estado de emergência, cancelando cerimónias de grande relevância nos períodos pascal e mariano, e de acordo com a legislação dos órgãos da soberania. A Conferência Episcopal Portuguesa, a Arquidiocese de Braga, a Diocese de Leiria-Fátima e outras Dioceses, cancelaram cerimónias litúrgicas presenciais para impedir aglomerados de fiéis ou peregrinos, evitando o risco de propagação do coronavírus. Foi muito doloroso a não realização de cerimónias religiosas ligadas ao passado, com continuidade no presente, onde se vivia a alegria da fé, tais como a Semana Santa de Braga, o treze de Maio em Fátima, romarias e variadas celebrações litúrgicas que passaram a ser transmitidas pelos meios televisivos ou outros. Entre estas destaca-se a Semana Santa de Braga, comemorando a Paixão e Ressurreição de Cristo, após muito trabalho dedicado e voluntário, e o treze de Maio em Fátima, cujo cancelamento foi comunicado no dia 6 de abril e reconfirmado a 3 de maio pelo Bispo de Leiria-Fátima, D. António Marto, após a Ministra da Saúde ter considerado a sua possível realização nos moldes do 1 de Maio, em Lisboa. Foi com o coração embargado em profunda dor, com simplicidade e humildade evangélica que se fez esta comunicação, mostrando a coerência da hierarquia da Igreja, contrariamente a outras situações autorizadas oficialmente, que não se deviam ter realizado. Mas a Igreja Católica milenária transmitiu uma mensagem humana e espiritual que ficará para a história deste momento de sofrimento, de privações e de mortalidade, quando o Papa Francisco caminhou isolado, dirigindo-se para a Basílica do Vaticano, no dia 27 de março. Foi em profundo recolhimento, meditação dolorosa profunda e vivendo a Paixão de Cristo, que celebrou uma cerimónia comovente, mas na alegria da fé cristã, e deu a bênção Urbi et Orbi para o mundo, numa abrangência global e direcionada para todos os continentes e com certeza o mundo vai ficar mais rico de humanidade e de valores espirituais.
Autor: Bernardo Reis
DM

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10 maio 2020