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Caçar talentos

Em todas as modalidades existem gerações ou atletas que se demarcam dos demais pela qualidade das capacidades físicas, técnico/táticas, mentais ou simplesmente pela plasticidade da forma como se expressam na respetiva modalidade. Numa fase inicial, os talentos estão marcados pelo perfil genético, mas na realidade, associado a esta determinante, existem os estímulos de treino que podem potenciar (ou não…) todas as capacidades dos jovens praticantes mais talentosos. Pode-se então definir um talento desportivo como: “todos os atletas que demonstrem capacidades inatas e incomuns para realizar determinadas tarefas ou práticas desportivas”.

Hoje, muitos clubes da elite em algumas modalidades, buscam incessantemente novos talentos para recrutar para os seus quadros. É evidente que a deteção de um praticante desportivo, com muito talento para determinada modalidade, não garante que este continuará a ser ou confirmará essas capacidades no futuro. Aliás, na história aparecem-nos nomes de atletas referência que se demarcaram dos demais sem se saber o seu historial, ou pelo contrário, atletas que demonstravam apetências muito precoces, mas que terminaram as suas carreiras muito cedo, sem ter chegado a níveis de topo em seniores. Sabemos que esta não é, nem nunca será, uma matéria exata, mas existe um mundo de probabilidades que podem ser maiores, quando a base é já de elevada competência ou condição, mas também desde que a qualidade do estímulo seja ajustada, juntando uma grande dose de determinação, entrega e dedicação, para se confirmarem as expetativas. As fases de deteção, seleção, formação dos talentos desportivos estão diretamente relacionados com processos de treino sistematizados a longo prazo, pelo que o ambiente exterior é tão ou mais importante que as capacidades observadas/mensuradas precocemente do jovem praticante.

Não tenho dúvidas que é na escola que tudo deve começar. Este modelo de deteção e orientação dos talentos deveria ter no professor de Educação Física o principal agente de “deteção”. No entanto, quando não existe esta sensibilidade perdem-se oportunidades. Em Portugal, fruto da nossa cultura, é facilmente constatável que as instituições, clubes, associações, federações, não estão habituadas a trabalhar coordenadamente, e cada um defende apenas é só o seu “quintal”. Muitas das nossas estruturas estão muito dissociadas umas das outras, as modalidades competem pelas mesmas crianças, e muito talento se tem perdido porque não existem programas de deteção, encaminhamento, orientação dessas crianças e jovens, e para além disso temos uma oferta desportiva nacional deficitária (tirando eventualmente o futebol).

Passada esta fase da deteção, é necessário criar as bases do desenvolvimento harmonioso, multilateral, através de atividades motivadoras, mas também desafiadoras. Depois de captada a criança e o jovem para o seu desporto, é necessário criar sistemas de avaliação e melhoria constante do desempenho, de forma a permitir respostas positivas e ajustadas às exigências das modalidades. E numa fase final de percurso desportivo proporcionar-lhes oportunidades reais de participação nas competições, devidamente ajustadas às competências e maturação. Caçar os talentos é uma “boa prática” fundamental para o processo da qualidade desportiva, e é consequência de uma atitude proactiva de todos os agentes envolvidos - treinadores, professores, pais e dirigentes.


Autor: Carlos Dias
DM

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5 novembro 2021