1. Como será o dia-a-dia na vida futura, após a morte?
Eis uma pergunta a que não é possível responder e que, além disso, parte de uma premissa equivocada.
2. É que, nessa altura, nem sequer haverá dias, muito menos noites.
Apenas – e sempre – haverá Deus e a Sua luz (cf. Sal 36, 10; Jo 8, 12).
3. Quanto ao mais, «nem os olhos viram, nem os ouvidos escutaram, nem jamais passou pela mente humana» (1Cor, 2, 9).
Resta-nos, pois, esperar e talvez conjecturar. Não há mal nenhum nisso.
4. Até os maiores peritos nas ciências bíblicas não se inibiram de idealizar cenários para a vida depois da vida.
Carlo Maria Martini não hesitou em confidenciar: «Na vida futura, irei cumprimentar Mozart, irei cumprimentar Bach».
5. Pela minha modestíssima parte, muito feliz serei – concedendo-me o Senhor essa graça – se ficar perto de Bach.
Tenho a certeza de que, perto de Bach, não estarei longe de Deus.
6. É que, olhando para o muito que ele compôs na terra, imagino – como Eduardo Lourenço imaginou – que, até na eternidade, «Bach estará a dar concertos para Deus»!
Não espanta, aliás, que não poucos considerem o genial compositor alemão como o «quinto evangelista». Gordon Craig foi ao ponto de garantir que a obra de Bach era «capaz de converter um ateu».
7. É claro que quem converte é Jesus Cristo.
A verdade, porém, é que a centralidade de Cristo avoluma-se de tal modo em Bach que nem o mais insensível lhe será indiferente.
8. A via da beleza («via pulchritudinis») faz transitar mais facilmente para o divino do que a mera via do conceito.
O conceito mostra e, frequentemente, demonstra. Mas só o belo consegue mover: a mente e sobretudo o coração. Não é por acaso que, para Zubiri, pensar, mais do que conceptualizar, é «comover-se».
9. E o certo é que não foram os argumentos teístas que trouxeram o filósofo Manuel García Morente aos umbrais da fé.
Foi a audição de «L’enfance du Christ», de Hector Berlioz, que fez dele um crente e até um padre.
10. Não me achando digno de ficar aos pés de Jesus, bastar-me-á ficar junto de quem tão bem O cantou na terra, para me sentir encantado por toda a eternidade.
Na companhia de Bach, espero continuar a louvar o Deus da minha – da nossa – vida. Será uma emoção sem nome. E uma festa sem fim!
Autor: Pe. João António Pinheiro Teixeira
«Basta-me ficar perto de Bach»!
DM
16 julho 2019