É verdade que não sabemos quais os efeitos que tais proezas trazem aos participantes. Poderemos auspiciar que devem ser benéficas, pois a repetição (anual e não só) pode ser o melhor crédito para que se faça algo de bizarro e um tanto a destoar do resto da população… em contraste com o recorrer em catadupa às urgências hospitalares com sobrecarga de procura e insuficiência de resposta.
= Ao vermos outras imagens dos festejos – na rua e nos espaços privados, com organização prévia ou com grandes gastos do erário público – do final-do-ano e da receção ao novo ano, parece que se vive uma confluência social de grande alcance… sem lamúrias nem despesas, com música a rodos e regados com muito álcool… ocasional ou programado.
Dá a impressão que uma (possível) ínfima minoria se interroga sobre estes espetáculos de luz e som, de cor e de alienação – senão pessoal ao menos coletiva – onde parece que se faz festa, mas se não sabe quem é, verdadeiramente, o festejado… Dá-se vivas, a quem? Exalta-se e exulta-se, quem? Festeja-se um alguém anónimo… qual entidade sub-reptícia, sem rosto e sem identidade…
Muitas das rolhas "glorificam" algo que não se sabe quem é nem onde está… Com efeito, este "mito" anónimo e desconhecido tem honras de festança, mas dilui-se por entre a multidão eufórica e um tanto anestesiada pelos eflúvios exalados do néctar de Baco, com trejeitos à celebração retardada de Dionísio…
= Quem não entrar nesta onda, como que poderá questionar-se sobre as razões e os objetivos de tais vivências. Quem se distanciar um tanto – e nem será preciso fazê-lo por repulsa ou por discordância – de tais festejos, corre o risco de entrar em questionamento sobre tudo quanto vê à sua volta…A envolvência – social e de consumo, crescente e de (quase) paganismo – como que faz os menos fervorosos sentirem-se à margem, se não da mentalidade, ao menos duma certa cultura reinante e mais ou menos abrangente…
= De vez em quando, lá surgem vozes que tentam explicar tais festejos, enumerando as expetativas para o novo ano… Na sua maioria são ainda de teor muito subjetivo e de motivação primária: saúde, dinheiro, melhores condições económicas, anseios de satisfação imediatista… projetos a muito curto prazo à mistura com reivindicações antigas e não-resolvidas como habitação, emprego, segurança (social e de policiamento… de forma direta ou atendendo a terceiros…
= Nota-se, por outro lado, uma espécie de intervalo na celebração religiosa de tal data. Muitos dos que foram preparando – mais ou menos convenientemente – a celebração do Natal, esfumam-se dos espaços comunitários de religião. Outros parece que suspendem o ritual um tanto cristão e mergulham na apatia geral senão mesmo na idolatria epicurista…
Como referia o Papa na mensagem para o 50.º "dia mundial da paz" falta-nos maior capacidade de acolhimento de Jesus, que é, de facto, a resposta aos anseios do nosso coração… Mas, se vemos tanta deserção dos que se dizem discípulos de Cristo, como poderemos credibilizar a mensagem d’Ele?
Dá a impressão que ainda nos regemos por uma visão de religiosidade de verniz, que, quando estala, logo deixa perceber o caruncho sobre o qual estava (ou está) alicerçada. É forte a sedução do mundo e pálida a convicção de tantos/tantas que percorrem os espaços duma certa fé, que mais parece uma loja de conveniência – cada um vai onde lhe dá mais jeito e onde se escuta o que menos incomoda – do que de caminhada em compromisso com as razões mais profundas da existência e da crença…
Para todos desejamos um ano de bênção e de paz…em Jesus, por Jesus e com Jesus, na Igreja, pela Igreja… em expressão católica!
Autor: A. Sílvio Couto