Os atletas portugueses estão cada vez mais a serem medalhados. São várias as especialidades em que se notabilizam ao ponto de os consagrarmos como agentes de prestígio nacional. Enquanto isto se impõe para nosso regalo, é preciso que as artes não deixem de aparecer: na pintura, escultura, cinema, teatro, escrita e toda e qualquer arte que aponte para o reconhecimento do valor do espírito. As artes não enchem estádios, não arrastam multidões e muito menos fazem bilheteiras. Mas são a excelência de um povo e de tal maneira que define e marca uma civilização. Mas como elevar uma coisa destas ao patamar do nosso desejo? Como todo o novelo é feito de fios que se enrolam, também as artes são os fios que estão por enovelar. Poderia, aí vai a sugestão, haver em cada autarquia uma atenção especial para as artes: lugares de exposição permanente para as artes, publicação de autores locais, concertos a miude, incentivo para a criação de conjuntos, etc. etc. E tudo isto sem ser preciso dispor de uma verba avultada no orçamento camarário. Por vezes, uma simples festa de distribuição de mensagens de mérito, chegaria para o reconhecimento. Depois, este pequeno círculo feito da pedra caída no lago adormecido, poderia ganhar dimensão regional e chamar atenção para outros pódios nacionais. O reconhecimento da obra do artista é o calor brando mas persistente da sua continuidade. Não pode ser a título póstumo configurando arrependimentos tardios. Chamar a juventude à arte, é abrir a porta larga da fuga para a frente. Ali mora a dimensão intelectual que, sem desprimor pelo esforço físico, é marca de excelência da localidade. Alma sã em corpo são, foi o sinete educativo da Grécia Antiga. Não me recordo de algum romano que se tornasse célebre por ser ganhador nos jogos dionísios, por exemplo. Mas lembro-me de Sócrates, Platão ou Aristóteles; assim como outros países tiveram Miguel Ângelo ou Rembrandt, Tintoretto ou Modigliani, Enrico Caruso ou Pavarotti, e “outros (mais) em quem poder não teve a morte” como bem disse o nosso Luiz Vaz de Camões. Descobridores e conquistadores de arrojo e valentia, repositório heroico da nossa História Pátria, tivemos alguns. Mas Camões só tivemos um. Se o corpo se quer forte para vencer no triplo salto, no judo, na canoagem, etc. etc, a cultura também tem de acompanhá-lo sob pena de termos novamente em Portugal, “braços fortes e cabeças ocas”. Um povo sempre será lembrado pelos seus feitos heroicos e, se as medalhas dos atletas estão neste patamar, e assim deve ser, são horas de lá colocarmos os nossos jornalistas, os nosso escritores, os pintores, os músicos, os teatrólogos locais, porque juntos deixarão de ser estrelas e passarão a ser constelações. Não podemos ficar extasiados com Saramago ou Egas Moniz, os nobeis portugueses; é preciso estrelar outros para que se não diga que Portugal tem a cabeça pensante nos cordões das sapatilhas. Um sarau por ano para homenagear os melhores das diversas artes locais, com júri independente na seleção, parece-nos inédita catapulta para salto maior. Conheço vários pavilhões desportivos mas não conheço nenhuma editora em Braga, a não ser a deste diário. A feira do livro é sempre escaparate dos outros. Parece-me que deixar a cultura ser o sol dos mortos, é permitir que o ocaso se sobreponha ao dia radioso.
Autor: Paulo Fafe