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As férias possíveis e até setembro

Se o meu prezado Leitor pertence ao grupo de portugueses que fecha a porta para gozo de férias num qualquer lugar de veraneio, considere-se um sortudo; e por variadas eóbvias circunstâncias, como sejam ter dinheiro para o fazer, não precisar do respetivo subsídio para tapar buracos ou comprar algo que, há muito, lhe faz falta ou, então, ocupar os dias de fériasafazer uns biscates para ganhar mais uns cobres ou, pior ainda, de pincel em riste a dar uma branqueadela aocortiço.

Pois é, desde que isto de gozar férias fora de portas virou moda e plataforma de afirmação social, mesmo que não se tenha onde cair morto e se faça recurso ao empréstimo bancário, instalou-se o reboliço nacional e a má-língua entre as comadres; e também que diacho, não é justo que o dinheiro seja como a água dos rios a correr sempre para o mesmo lado que é o bolso de quem muito já tem ou consegue, qual Berardo, favores dos bancos e banqueiros; ao menos, que haja um pingo de vergonha e de bom senso tal como dizia o sapateiro de Braga ou comem todos ou haja moralidade.

Agora, bom, bom era poderem ir todos os portugueses de férias mesmo que não fosse para estâncias de sonho, os tais paraísos na terra, onde corre o leite e o mel, e os horizontes amplos e livres alfobres são de magia e encantamento próprios para corações ardentes e apaixonados, e não para praias de águas geladas, areias conspurcadas, ventos agrestes e horizontes cinzentos; e, sobretudo, com vazas e vazas de gentinha rude, poluída e poluidora que tem dificuldades genéticas em saber ser, saber estar e, assim, usufruir espaços comunitários e congruentes.

Todavia, o pior étermos de carregar para férias que é como quem diz para banhos os problemas de um país a saque, vilipendiado e usurpado; e mais que tudo pasto de biltres e abutres que lhe sugam, insaciáveis, impantes e impunes, a natureza e o sangue; um país sem rumo e sem jaça onde impera a lei do mais forte e do mais desavergonhado.

E, então, aqui chagados, o povo, o bom povo enfrenta os problemas de uma sociedade corrupta e corruptora; e cuja corrupção é, mormente, filha da política e da banca e para julgamento entregue está a um sistema judiciário sem meios, inerte e moroso sem que os políticos se interessem em lhe pôr cobro, pois mais preocupados andam em arranjar tachos para toda a família, compadres e comadres nos organismos estatais; e a juntar a esta problemática, por isso cresce na sociedade o descrédito e desvalorização pela política e pelos políticos.

Pois bem, ademais, ainda temos de carregar para férias um Serviço Nacional de Saúde (SNS) caótico, falido e ineficiente, dominado por ideologias de esquerda e extrema-esquerda que consentem haver doentes, inclusive oncológicos,à espera meses e anos por uma consulta ou cirurgia; como igualmente o mesmo cenário se repete nas repartições públicas das maiores cidades para obtenção do cartão de cidadão ou de uma mera certidão de casamento.

Como ainda carregamos para férias um Estado Social incapaz e injusto que não protege como devia quem trabalhou uma vida, que atrasa por muitos meses o pagamento das respetivas pensões de reforma já atribuídas, preocupando-se com batoteiros e mandriões que recusam ofertas de trabalho em prol de benefícios e apoios de inserção social; ou ainda o menosprezo dos ministérios da Educação, da Saúde, da Administração Interna e da Justiça pelos direitos dos seus trabalhadores, mesmo que consignados na Constituição da República.

E pasme-se, para fim de festa, com a ação repressiva, pidesca e rapace da Autoridade Tributária e Aduaneira que monta uma operação de Stop numa estrada para caça aos devedores ao fisco; ou seja, qual Zé do Telhado persegue e assalta a céu aberto sem respeito e com a convicção de quem todo pode, tudo manda, numa claríssima demonstração de exercício de poder terceiro-mundista, onde a ideologia marxista-leninista assenta que nem uma luva.

Pois é, meu prezado Leitor, se for capaz de deitar tudo isto para trás das costas e partir para gozo de férias a assobiar de contente, considere-se um ser absolutamente feliz, porque oriundo de um outro planeta onde tudo isto não passa de um tremendo e ruidoso quiproquó que somente afeta os anjinhos mesmo que de carne e osso.

Então, as férias possíveis e atésetembro.

Nota:O autor usou, no artigo publicado na página 2 do dia 3 de julho, intitulado “Apanhados 8”, o termo arruaceiros, referindo-se ao grupo de cavaqueio que se reúne junto ao posto de turismo; ora, considerando que tal termo foi de inadequada e imprópria utilização, vem o autor pedir desculpas ao grupo por tal procedimento.


Autor: Dinis Salgado
DM

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10 julho 2019