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As desigualdades no mundo humano e o esquecimento do país interior

A justiça social anda muito divorciada nas sociedades humanas. Enquanto uma grande parte das pessoas luta por uma sobrevivência mínima, outra, constituindo uma casta privilegiada, vive pomposamente na abastança. Alguns desses ourudos nem sequer precisaram de trabalhar muito para integrar essa franja de indivíduos singulares. Uns herdaram grandes patrimónios, outros adquiriram-nos por meios ilícitos e certos outros foram bafejados por uma espécie de “sorte milagrosa”.

Só que, por vezes, na ânsia de alcançar as grandes fortunas, não têm pejo em utilizar a violação sistemática dos direitos humanos. A avidez não os deixa ter em consideração a existência de outras coisas mais significativas e mais nobres do que a riqueza material. Tais pessoas resistem ao alerta da consciência que as quer encaminhar para o reconhecimento dos valores éticos que teimam em desprezar.

Tudo o que uma pessoa faz deve ser definido pela escala de valores universais que, pela sua essência intrínseca, respeitam a dignidade humana. A verdadeira riqueza apoia-se sempre em valores sólidos e autênticos, como o trabalho, a honestidade e a justiça social.

Acresce ainda que os valores têm que ser bem interiorizados, de tal modo que a pessoa, ao agir, não tenha necessidade de estar a pensar permanentemente neles. Com o decorrer dos anos, já os vai executando sem necessidade de uma reflexão diária imediata. Essas ações já fazem parte integrante da sua personalidade.

Mas, infelizmente, continuam a agravar-se as assimetrias entre os povos e, no mesmo país, entre as várias regiões. Quem cuida do interior como ele merece? Para onde vão as grandes verbas públicas? Onde estão as medidas compensatórias? Pelo contrário, os responsáveis pelos destinos do povo perdido por detrás das montanhas e dos vales deixam-no cada vez mais abandonado.

O esvaziamento do interior é uma inevitabilidade por causa da eterna carência das mais que justas infraestruturas e das mais diversas valências, devidamente apetrechadas e que são indispensáveis para uma vida mediana e saudável. Vem isto a propósito do acidente ocorrido com o helicóptero do INEM na serra de Valongo.

Apenas há disponível um desses helicópteros para toda a região interior norte. Que vergonha! Além disso, todos procuram as causas explicativas do acidente, mas onde elas não estão. Se os hospitais de Bragança e de Mirandela ou outros do norte do país estivessem apetrechados de excelentes serviços nas várias valências da saúde, não havia necessidade de transportar doentes para o Porto ou outro grande centro citadino litoral, a não ser em casos extremos ou de grandes calamidades.

Quantas vidas se poupariam? Falo por experiência própria, pois eu, há 7 anos e meio, sofri várias paragens cardiorrespiratórias num espaço de tempo de apenas uma hora, intervaladas por poucos segundos entre elas, lá na província onde eu estava. A ambulância, já a cair aos bocados, chegou ao local duas horas depois e veio apenas com o condutor.

Devido a uma cerimónia religiosa que aí decorria, tive a sorte (que divina coincidência!) de estar lá um excelente cardiologista que exerce a sua profissão num hospital do Porto. A ele devo mais estes quase oito anos de vida normal. Bem haja e muitíssimo obrigado! Voltando ao tema em análise, pergunta-se, repetindo, com muita propriedade: Quantas vidas se poupariam se o interior do país tivesse mais e melhores meios locais? Aliás até se economizariam chorudas verbas se o interior tivesse as referidas valências bem apetrechadas. Peço aos responsáveis que reflitam nestes problemas.


Autor: Artur Gonçalves Fernandes
DM

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20 dezembro 2018