Li com muita satisfação a ideia de fazer do Monte Picoto um espaço selvagem. E, com igual satisfação, pela libertação da águia que depois de resgatada, tratada e ensinada, voltou aos céus. Águia Picoto é um nome excelente, como excelente é o esboço ou ideia que o sr. Vereador municipal de Braga, Altino Bessa, tem para implementar no Monte Picoto um habitat para animais selvagens. Congratulo-me com a ideia, apoio a realização e exulto com aqueles que, como eu, entendem que os animais não devem ter nem jaula de circo, nem gaiola de pintassilgo, nem mesmo em jardins zoológicos. Aves, répteis ou carnívoras, de grande ou pequeno porte, foram criados para viver em liberdade e não para serem enjaulados. Gostaria de aqui deixar um pedido: se têm animais em cativeiro, num gesto de boa vontade, abram as gaiolas, cerrem as grades e vão entregá-los a quem os possa reabilitar para uma vida em liberdade. Sol, azul, vento, chuva, corridas nas matas, caçadas para sustento, é a vida em plenitude. Se há voluntários para tanta coisa por que não haver voluntariado para abrir gaiolas e grades a animais em cativeiro? Seria um alívio para os condenados e um bem-estar para quem os observa de olhos tristes ou a passear, de um lado para o outro, num espaço de escassos metros quadrados. Olho-os através das grades e lembro-me, por semelhança, do que aconteceria aos humanos, se um dia uma raça superior à nossa nos metesse em jaulas para preservar a espécie ou ser objeto de curiosidade circense. Claro que há animais, principalmente cãezinhos que nasceram em cativeiro, como os filhos dos primeiros escravos, e que, por habituação desde o nascimento, agora não estariam aptos para viver em espaço selvagem. São escravos mesmo antes de nascerem. Para esses condenados sem pecado, o remédio é deixá-los estar no colo de quem lhes chama de filhos. Mas deveriam ser colos a extinguir quando vagar. Lembro-me do melro de Guerra Junqueiro que preferiu matar os filhos do que vê-los em cativeiro. A prisão, mesmo que dourada, é um ultraje à dignidade de qualquer ser vivo. Vejam os olhares dos macacos presos! A mim parecem dizer: “tira-me daqui, que fiz eu para este castigo, eu nasci na liberdade da selva, nasci para me balouçar de galho em galho e não para estar atrás dumas grades à espera que a inocência das crianças me dê uma banana para descascar!” Eu penso nisto e olho à volta do Picoto: vejo as montanhas da Santa Marta e a do Sameiro a deitar-se no colo da do Bom-Jesus e penso em delírio: isto tudo junto vai ser o ninho das águias Picoto. Isto não é delírio, corre na realidade; corre como eu gostaria de ver correr esquilos, raposas, galináceos, lagartos e linces neste espaço selvagem, a par da logística que tal demandaria, como é evidente. Sei lá se nos ares não veríamos, para além de águias Picoto, outras espécies de aves riscando os horizontes, em voos picados ou delicadas voltas, tecendo no azulino dos céus bailados suaves numa coreografia filigranada? Que encanto para os olhos e que apetite em ter asas para ir com elas! Defendemos a natureza contra a poluição, defendemos a natureza contra os incêndios, as queimadas e a pecuária excessiva e tudo isso é magnífico! Então, por que temos e defendemos o cativeiro doutros animais? Também de liberdade precisam os animais e quem dar-lha souber bendito seja. Não há lógica neste sonho? Mas eu sonho.
Destaque
Se há voluntários para tanta coisa por que não haver voluntariado para abrir gaiolas e grades a animais em cativeiro?
Autor: Paulo Fafe