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Abramos a Cristo a porta mais bela: a da esperança!

Nos momentos tão difíceis que enfrentamos, o Natal pode e deve ser a ocasião para um sobressalto de reafirmação do papel nuclear da esperança na vida pessoal, da Igreja e do Mundo. Maria, dando-nos Jesus, é fonte viva de esperança, como já proclamava Dante. Damos uma breve síntese da segunda catequese de Advento do cardeal Cantalamessa à Cúria Romana.

Com a ressurreição de Cristo, para o crente, a morte já não é uma aterragem no esquecimento, mas um levantar voo: «semeado corruptível, o corpo é ressuscitado incorruptível…, semeado na fraqueza, é ressuscitado cheio de força; semeado no corpo terreno, é ressuscitado corpo espiritual». (I Cor 15, 43-44)

Reflectir sobre a esperança é reflectir sobre o sentido último da nossa existência, porque, como observava Santo Agostinho: «De que serve viver bem, se não é concedido viver para sempre?» A esperança teologal garante-nos que Deus nos criou para a vida; não para a morte. Jesus veio revelar-nos a vida eterna e dar-nos a garantia dela com a sua ressurreição. É precisamente a esperança da vida eterna que torna bela, ou pelo menos aceitável, também a vida presente, apesar de todas as dores, sofrimentos e incompreensões. Porque uma coisa é sofrer sem saber com que finalidade, e outra coisa é sofrer, sabendo «que os sofrimentos do tempo presente não têm comparação com a glória futura que será revelada em nós». (Rom 8, 18).

A finalidade da actividade evangelizadora da Igreja é descrita como a de dar «razão da esperança que existe em nós». (1 Ped 1, 3). E hoje, ainda é mais urgente uma regeneração da esperança, se de facto quisermos empreender uma nova evangelização. Nada se faz sem esperança. As pessoas vão para onde se respira um ar de esperança e fogem de onde ela não existe. É ela que dá coragem aos jovens para formarem uma família ou seguirem uma vocação religiosa ou sacerdotal; é ela que os mantém longe da droga e de outros narcóticos que mais não são do que cedências ao desespero.

A carta aos Hebreus (6, 18-19) fala da esperança como uma âncora segura da nossa vida. Segura, porque arreigada, amarrada na eternidade. Mas também pode ser considerada como uma vela que faz avançar e caminhar no mar da vida. E ambas as coisas faz a esperança com a barca da Igreja. E mais do que defender a esperança dos ataques externos, devemos proclamá-la, oferecê-la e irradiá-la no mundo, com um discurso propositivo. É esse o melhor antídoto para um mundo que perdeu o sentido da esperança e recai cada vez mais no pessimismo e niilismo, que é o verdadeiro buraco negro do universo.

Uma das constituições mais luminosas do Vaticano II intitula-se precisamente: Gaudium et spes (Alegria e esperança). Dá corpo a uma frase forte de Paulo aos Romanos (15, 13): «O Deus da esperança vos encha de toda a alegria e paz, na fé, para que abundeis na esperança pela força do Espírito Santo». A Igreja não pode dar nada melhor ao mundo que a esperança pura e simples que tem por horizonte a eternidade e por garantia Jesus Cristo e a sua ressurreição. Terá de ser esta esperança teologal a fazer de mola propulsora de todas as outras legítimas esperanças humanas. Uma esperança assim entendida transforma tudo aquilo que toca, como já o afirmava Isaías (40, 31): «quantos esperam no Senhor renovam as suas forças. Têm asas como a águia, correm sem se cansar, marcham sem desfalecer».

Deus não prometeu tirar os motivos de cansaço, desilusão e esgotamento, mas dá esperança. A situação permanece a que era, mas a esperança dá a força de se elevar acima dela, como o sugere o Apocalipse (12, 13-14), inspirando-se em Isaías: à Igreja foram dadas as grandes asas da esperança, para que, com elas, possa fugir dos ataques do mal e superar com generosidade as dificuldades. A esperança é uma grande taumaturga, uma grande operadora de milagres: levanta sempre quem se deixa auxiliar pela força do Espírito.

A esperança é também uma grande ajuda para o nosso caminho pessoal de santificação. Ela torna-se, para quem a exercita, o princípio do progresso espiritual. Permite encontrar sempre novas possibilidades de bem, algo que se pode fazer para melhorar a situação. Não deixa que se caia na tepidez e na acédia. Quando a tentação parece dizer que nada há a fazer, ela diz: «Reza». E se a situação parece mesmo desesperada, ela continua a dizer: «reza, suporta até ao fim e não percas a paciência, unindo-te a Cristo na cruz». Só assim poderemos viver na esperança, pela virtude do Espírito Santo. Não pelos nossos esforços.

O Natal é a ocasião para um estremecimento de esperança. Ela, como belamente diz Péguy, é a mais pequena das 3 virtudes: Fé, Esperança e Caridade. Como 3 irmãs, caminham de mão dada: as duas grandes, Fé Caridade, aos lados, e a Esperança, ao centro. Vendo-as, as pessoas podem pensar que são as duas grandes que levam a pequenina. Mas enganam-se. É a pequenina que arrasta tudo, porque, se vier a faltar a esperança, tudo fenece e morre.

Um Santo Natal, vivido na esperança e com firme esperança!


Autor: Carlos Nuno Vaz
DM

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24 dezembro 2022