Li com todo o interesse a crónica de Silva Araújo pelo que deixou expressa nas suas reflexões. Sem pretender meter colherada, para isso falta-me o saber teológico, a verdade é que como discípulo de Jesus, parece-me que há em Silva Araújo uma aproximação entre a Igreja-instituição e a Igreja-de-todos; isto levou-me a pensar que não estava enganado quando pensava que os mandamentos da igreja se sobrepuseram alguns aos mandamentos de Deus. Discípulo da catequese do velho testamento, onde Deus era mais carrasco que pai, e fazendo a transição desta igreja para a igreja do novo testamento, onde a igreja é perdão e amor, ficou-me um mar de controvérsia que, por vezes, me levou ao agnosticismo; as igrejas ou catedrais sumptuárias, contrastavam com a indigência dos crentes. As obras de misericórdia davam a pauta e a orquestra tocava outras coisas. E, neste contraste ficava-me a perplexidade do acreditar. Mas esta sensação ia-se atenuando ao ver que a fé em Cristo era tão forte a tão necessária ao meu interior, que me levou a concluir que uma coisa era a Igreja feita por homens e outra coisa era a Igreja feita pelos evangelhos, onde o meu herói, Jesus Cristo, irradia do alto da Cruz do martírio, o esquecimento de si: E “O meu coração angustiado ia ao trono de Deus pedir, como sempre vai/ Para toda a nudez um pano do seu manto/ Para toda a miséria o orvalho do seu pranto/ E para todo o crime o seu perdão de Pai”; o poeta falava em dar de comer a quem tem fome, dar de beber a quem tem sede, vestir os nus, visitar os encarcerados, defender os fracos e oprimidos… é uma nunca mais acabar de humanismo católico que toca lá bem no fundo o hino da partilha. A Igreja católica, enquanto poder temporal, atropelou a sua essência; se não fosse a fé dos homens, já teria “falido” como instituição. Hoje olho para Fátima como uma certeza concreta de fé: duma cova rude e informe surgiu um altar de fé. E esta é maior que a Igreja porque perdoa e esquece desvios passados. O Papa Francisco é um “herege” em matéria da Igreja do “quero, posso e mando”; com isto ele regressa às catacumbas onde a essência de Jesus tem o outro como irmão; é esta a verdadeira génese do catolicismo. Os que alinham no conceito de que o poder temporal da Igreja é a manifestação e o reflexo do poder de Deus, tentam, no meu parecer de cristão, defender um igreja empresa e não uma igreja de Jesus. Julgo que quanto maior for o poder temporal desta Igreja/Instituição, menos poder espiritual tem a Igreja/Amor. A Igreja/Instituição impôs-se aos fiéis pelo medo da condenação eterna. Ora quem ama não condena para sempre, antes faz do perdão um caminho de redenção. Os milagres pertencem a Jesus Cristo e não é a velinha que arde, ou o arrastar dos joelhos no cumprimento duma promessa, nem pelo número de vezes que assiste às procissões; outrossim pelo amor intrínseco a Jesus, naquela interioridade que nos leva a estar com Ele, quando estamos com o outro. Este Jesus feito homem, é mais irmão que juiz, mais próximo do consolo do que do desespero, mais realidade humana do que entidade metafísica. Este sínodo tem de vencer os instalados; penso que a juventude que tudo racionaliza vai pensar e assumir que há outro caminho para lá do positivismo. Para isso, a Igreja tem de ser coerente entre a doutrina que prega e a praxis se quiser assistir ao regresso dos que agora se afastam. Eu não quero ensinar o padre-nosso ao vigário mas não quero que o vigário se limite a rezá-lo.
Autor: Paulo Fafe