Nos últimos anos, a sociedade portuguesa tem sido sacudida por vários escândalos que ciclicamente a têm posto em sobressalto. Bastará um pequeno esforço de memória para lembrar a ruína do banco BPN e, consequentemente, a investigação “Monte Branco”, sobre fraude fiscal e branqueamento de capitais, despoletada pela falência do mesmo, o descalabro do Grupo Espírito Santo e, mais recentemente, tudo quanto está relacionado com a investigação que envolve, entre outros, o ex-primeiro ministro José Sócrates.
Este processo judicial denominado “Operação Marquês”, iniciado em 2014, tenta desvendar, pelo que tem vindo a público, uma imbrincada e monstruosa rede. Na realidade, a ser verdade muito do que tem sido revelado, não se tratará apenas de um conjunto de múltiplos crimes mas, muito mais do que isso, uma tentativa bem orquestrada para perpetuar no poder o então primeiro-ministro, ao bom estilo do desaparecido Hugo Chávez, ou do seu sucessor Nicolás Maduro.
Bem mais do que apurar a origem e a pertença dos muitos milhões envolvidos resultantes de ações de corrompimento, de pagamento de cumplicidades e outros favores que prejudicaram o país ao ponto de o conduzirem à situação de bancarrota, não será desmedido ir mais longe e presumir o destino que nos estava reservado, se Portugal não tivesse tido a necessidade de ajuda financeira externa.
Na realidade, ao envolvimento há muito conhecido do ex-ministro socialista e ex-administrador da Caixa Geral de Depósitos Armando Vara, entre muitas outras personalidades, veio juntar-se, recentemente, o também ex-ministro do governo de José Sócrates, Manuel Pinho que, enquanto ministro, manteria ligações éticas, políticas e deontologicamente reprováveis com o Banco Espírito Santo. Ora, se a tamanha teia se juntar as ligações que o próprio ex-primeiro ministro mantinha com o falecido presidente da Venezuela Hugo Chávez e com o agora detido ex-presidente do Brasil Lula da Silva, não será mero devaneio pensar que bem mais do que uma panóplia de crimes económicos estava em marcha uma tentativa de perpetuar o poder e, quiçá, de transformar o regime numa ditadura semelhante à que hoje amordaça e leva à miséria o povo venezuelano.
Nesta perspetiva, o pedido de ajuda externa e a consequente vinda da “troika”, que durante mais de três anos sujeitou o povo português a um rol de sacrifícios que tão cedo não devem ser esquecidos, foi uma bênção, pois teve o mérito de pôr fim não só aos desmandos do governo de José Sócrates, mas também de impedir a instalação em Portugal de um poder tirânico e absoluto.
É também nesta sequência e por necessidade de se demarcar de uma governação que tanto mal trouxe aos portugueses que o Partido Socialista se veio agora afastar daquele seu ex-militante. De facto, quando está a poucos dias de acontecer o mais importante conclave socialista e se avizinham eleições importantes para o nosso futuro coletivo, o partido liderado por António Costa não tinha outra saída, sob pena de comprometer irremediavelmente as suas ambições.
A cerca de um ano do início de um novo ciclo eleitoral, quando no tempo que falta podem surgir outras revelações e novos factos que ainda possam denegrir mais a atuação de José Sócrates e dos seus governos, a não demarcação por altos quadros do atual governo e do partido maioritário que o apoia seria um perfeito suicídio político.
António Costa, não tendo muito mais tempo para calar o profundo incómodo que os comportamentos de alguns dos seus correligionários que consigo fizeram parte dos governos que arruinaram o país, com astúcia e o habitual sentido de oportunidade que se lhe reconhece, rompeu o cerco que poderia deitar por terra todas as suas aspirações.
Não sendo possível determinar os danos já causados e outros que futuros desenvolvimentos da “Operação Marquês” podem provocar, o Primeiro-ministro não deixou escapar o momento, dando mais uma vez provas de enorme sagacidade e de grande habilidade política.
Se ainda foi a tempo, só o futuro o poderá desvendar.
Autor: J. M. Gonçalves de Oliveira
A recente demarcação do Partido Socialista
DM
15 maio 2018