No Domingo passado, o primeiro deste mês de Maio, a Igreja Católica comemorou o dia da Mãe, que significativamente é assinalado no mesmo mês em que os seus crentes manifestam de forma particularmente intensa a sua devoção à Virgem Maria, símbolo universal do amor maternal.
E, como sempre sucede, a efeméride é pretexto para que cada família homenageie as suas mães, confraternize com elas, oferecendo-lhes prendas, visitando-as, dedicando-lhes belíssimos e ternos textos, em prosa ou em verso e, em suma, expressando-lhes toda a gratidão pelas vidas que deram ao mundo e pelos sacrifícios e sofrimentos que padeceram por amor dos seus filhos.
Entre os escritos que tive o ensejo de ler, quero partilhar com os meus estimados leitores um que, via Facebook, um amigo me fez chegar, extraído do blogue pessoal “Comece o dia feliz, Evangelizando”:
“Sempre que encontrar uma casa em que todos riem felizes e confraternizam no amor, tenha absoluta certeza de que ali mora uma mulher esquecida de si mesma, dedicada ao cultivo do amor, que colhe a paz, a harmonia e a felicidade. Essa mulher que se esquece para não esquecer os que dela dependem; essa mulher que só se alimenta quando todos estão bem alimentados; essa mulher que não dorme enquanto alguém está acordado – só pode ser uma MÃE”.
Este e outros lindíssimos textos, repletos de belos e justos pensamentos, suscitam-me uma reflexão que se me afigura algo paradoxal com o carácter laudatório daqueles escritos.
Na verdade, apesar da grandeza e alta responsabilidade da função de mãe, subsiste uma certa cosmovisão misógina que teima em negar às mulheres direitos idênticos aos dos homens, como se umas e outros não fossem iguais em dignidade. E esta ideia de desequilíbrio é tanto mais injusta quanto é certo que, a par das imensas tarefas domésticas e familiares, a grande maioria das mulheres desempenha funções profissionais em quase todos os sectores de actividades, designadamente nos serviços essenciais, prestando trabalho igual ao dos homens. Veja-se, a título de exemplo, a escandalosa discrepância dos salários femininos ou os escassos lugares de liderança empresarial, financeira e política que às mulheres são destinados.
Como ainda agora se tem visto no combate à pandemia que nos vem assolando, são elas que, maioritariamente, trabalham na linha da frente, mas que, simultaneamente, são mais vulneráveis à perda de emprego e à quebra de rendimentos e as que mais trabalham tanto dentro como fora de casa.
E não deixa de ser paradigmático que, também ao nível religioso, o papel das mulheres continue a ser desvalorizado, circunscrevendo-as essencialmente à função de mãe e de trabalhadoras e apartando-as das grandes decisões eclesiais.
É certo que o actual Papa Francisco tem feito pedagogia no sentido de sublinhar a igualdade radical entre os cônjuges, de procurar assegurar uma presença feminina “mais incisiva na Igreja”, de reclamar a necessidade de mais teólogas, de propugnar a intervenção e valorização das mulheres na vida eclesial e de defender que homens e mulheres são iguais em dignidade, sacramentalmente reconhecida pelo Baptismo.
Todavia, este discurso tem sido estruturado mais com base numa intuição pessoal, do que em princípios teológicos ou em explicações místicas.
Num mundo em que a Virgem Maria é vista como a “Mulher mais poderosa do Mundo”, como ainda há cerca de meia dúzia de anos a classificava a renomada revista norte-americana National Geographic (edição de 08/11/2015), choca ver que as mães e mulheres de todo o mundo não hajam alcançado a dignidade plena que a Rainha do Céu e Mãe da Igreja para elas resgatou.
Autor: António Brochado Pedras