1. No passado dia 19 foi prestada, postumamente, homenagem pública a Aristides de Sousa Mendes. No Panteão Nacional foi colocada uma placa com o seu nome. O corpo continua no jazigo de família, em Cabanas de Viriato, onde nasceu em 19 de julho de1885.
Justificando a homenagem disse-se que em junho de 1940, em plena II Guerra Mundial, quando era cônsul de Portugal em Bordéus, com a sua assinatura salvou a vida a vários milhares de refugiados judeus e não só, vítimas da perseguição nazi.
As tropas alemãs entraram em Paris em 14 de junho de 1940. Muitos dos refugiados tentaram vir para Portugal. Aquele diplomata, contrariando ordens de Salazar, concedeu visto a todos os que lho pediram.
Para esta decisão contribuíram as suas convicções cristãs. A 17 de junho de 1940 abriu a porta do consulado e disse: ‘doravante darei vistos a todos’. ‘Mesmo que me destituam, só posso agir como cristão, como me dita a minha consciência; se estou a desobedecer a ordens, prefiro estar com Deus contra os homens do que com os homens contra Deus.’
2.Isto sugere-me diversas reflexões:
2.a. A importância de formar bem a própria consciência e de agir de harmonia com ela. Ser senhor de si e mandar em si.
Referiu-se-lhe o Papa Francisco, em 17 de junho de 2020, quando disse: «Que a liberdade de consciência seja sempre e em toda parte respeitada; e que cada cristão possa dar exemplo de coerência com uma consciência reta e iluminada pela Palavra de Deus».
É imoral e indigno trair a consciência e as próprias convicções com o objetivo de conseguir um tacho/ou nele permanecer.
A voz da consciência bem formada deve falar mais alto do que a voz do líder.
2.b. É dever do cristão obedecer aos legítimos superiores (Catecismo da Igreja Católica, 2238).
O cristão vê no superior um representante de Deus. Mas quando as ordens do superior contrariam o que se sabe ser a vontade de Deus…
Legislar não é agir arbitrariamente, defendendo interesses pessoais ou de grupo, mas ter em vista o bem comum. «Ninguém pode mandar ou instituir o que for contrário à dignidade das pessoas e à lei natural» (Idem, 2235).
Leio também no número 1903: «A autoridade só é exercida legitimamente na medida em que procurar o bem comum do respetivo grupo e em que, para o atingir, empregar meios moralmente lícitos. No caso de os dirigentes promulgarem leis injustas ou tomarem medidas contrárias à ordem moral, tais disposições não podem obrigar as consciências. «Neste caso, a própria autoridade deixa de existir e degenera em abuso do poder».
Isto de colocar a fidelidade à ideologia acima do bem comum…
2.c. O dever de formar bem a própria consciência e de agir de harmonia com ela tem anexo o direito à objeção de consciência. Transcrevo o número 2242 do citado Catecismo:
«O cidadão é obrigado, em consciência, a não seguir as prescrições das autoridades civis, quando tais prescrições forem contrárias às exigências de ordem moral, aos direitos fundamentais das pessoas ou aos ensinamentos do Evangelho. A recusa de obediência às autoridades civis, quando as suas exigências forem contrárias às da reta consciência, tem a sua justificação na distinção entre o serviço de Deus e o serviço da comunidade política. «Dai a César o que é de César, e a Deus o que é de Deus» (Mt 22, 21). «Deve obedecer-se antes a Deus que aos homens» (Act 5, 29):
«Quando a autoridade pública, excedendo os limites da própria competência, oprimir os cidadãos, estes não se recusem às exigências objetivas do bem comum; mas é-lhes lícito, dentro dos limites definidos pela lei natural e pelo Evangelho, defender os seus próprios direitos e os dos seus concidadãos contra o abuso dessa autoridade».
A objeção de consciência é um dos direitos garantidos pela Constituição da República Portuguesa (artigo 41.6).
Autor: Silva Araújo