Há uma citação de Séneca, advogado, escritor e intelectual, nascido no século IV, que me tem acompanhado no estudo sobre Modelos e Governação das Cidades que merece ser partilhada: “una era construye ciudades. Una hora las destruye”. A visão é quase apocalíptica, mas merece uma reflexão ponderada, face à voracidade de soluções emergentes na liderança urbana, que parecem aparentemente remediar todos os males ao mesmo tempo que fragilizam o ecossistema urbano que juram defender. Uma boa parte deste no sense é polarizado por uma geração de novos políticos, saídos do nada, aparentemente cultos e sabedores, construtores de “pequeñas repúblicas venecianas” como lhe chamou Pablo Sanchez Chillon, especialista em políticas urbanas e simultaneamente despojados de sensatez.
A este exercício da nouvelle politique popular e simulada, junta-se uma outra realidade, para a qual se deviam centrar as atenções: a inusitada arrogância presente no discurso de algumas silhuetas públicas que se manifestam dia a dia como metástases de um cancro-uma dura realidade que nos deveria fazer pensar sobre a instantaneidade, adversa do tempo que se exige para a assimilação e aplicação do Conhecimento. O diálogo que se segue explica melhor esta ideia; apareceu por estes dias nas redes sociais e simboliza, de alguma forma, o drama que veste a cidade. Eis o diálogo: “Se eu tivesse maturidade de hoje, não teria errado tanto! – Se você não tivesse errado tanto, não tinha a maturidade de hoje”.
As duas citações em causa são uma espécie de espelho de uma tendência pública e política, sedenta de novos protagonistas, que transforma dados em base de discurso político, mas sem a substância que o Tempo permite – esse eterno inimigo de uma geração que se banha no “oceano da superficialidade, plástica e impostora que tudo contamina”. Todos nós, de alguma forma, nos confrontamos com esta visão dualista e compreendemos a importância da experiência e a maturidade subsequente, como absolutamente cruciais no nosso crescimento intelectual e profissional. Contudo, a realidade que nos cerca está pejada de maus exemplos e maus intérpretes desta condição tão natural no ser humano. Dia a dia, parte do que leio, ouço e vejo parece mais um desfile da ignorância, da sobranceria e da vontade acérrima de chegar depressa onde outros demoraram tempo, não por não serem capazes, mas porque procuram soluções duradouras- característica da ponderação e equilíbrio que a idade ajuda a cimentar. Não se tratando de um problema ou uma tendência exclusivamente portuguesa, a ascensão do discurso fácil, das frases feitas, da simbologia neonatal urbana, invadiu o nosso quotidiano; tornámo-nos aparentemente crentes da sua dinâmica, da aparente resposta positiva que dão às nossas preocupações e das soluções á La Carte. Na Europa comunitária assistimos a um divórcio geracional que empurrou novos protagonistas para graus de decisão para os quais não estão preparados, abandonando a disciplina da sabedoria que o tempo constrói, sem aparentemente ter tempo para errar, mas errando a tal velocidade que a perceção do cidadão comum acaba por ser manipulada por um processo de comunicação agressivo e em alguns casos despojado de valores e dos mais elementares princípios de racionalidade e de bom senso.
Os desafios que enfrentamos não permitem distrações, muito menos facilitismos, mas porque esta é a oportunidade de ouro, torna-se obrigatório uma revisitação ao significado de cidades e àquilo que se espera delas: políticas consentâneas com modelos preditivos, visão integrada e um modelo de intervenção estimulante, persuasivo e sustentável. Encontrar o equilíbrio intergeracional, transformar a política em modelo de participação pública e socializante e ter uma visão de cidade livre de populismos e de falsa democracia, são desafios para todos os que acreditam no poder de transformar os espaços urbanos, conferindo-lhe à priori, não o poder veneziano, mas o direito ao exercício ponderado e racional que conduza o novo poder urbano a um futuro equilibrado, saudável e inteligente.
Autor: Paulo Sousa