Os números são mais objectivos do que as palavras. As palavras podem ajudar a explicar – e em política, quase sempre, servem para amplificar as superações e reduzir o incumprimento de metas e propostas –, mas os números é que dizem tudo, sobretudo, os números relativos. As palavras podem impressionar – muitas vezes, conseguem mesmo iludir –, mas são os números que sustentam o que se diz. Isto vem a propósito do anúncio do Governo de que o salário mínimo nacional crescerá mais em 2023 do que em qualquer outro ano. É verdade que, em termos absolutos, em nenhum ano das últimas décadas, este referencial cresceu tanto (55 euros), mas isso não significa que se trate, realmente, do maior aumento. Vamos à matemática. De acordo com a decisão do Governo, o salário mínimo nacional passará a ser, em 2023, de 760 euros, 7,8% mais do que no ano em curso em que é de 705 euros. Mas, o que interessa, mais do que o aumento absoluto, é o aumento relativo. Aliás, é este que nos ajuda a perceber se é suficiente para cobrir a taxa de inflação ou se fica aquém dela e os trabalhadores perdem poder de compra. Neste sentido, o aumento previsto para o próximo ano está longe de outros aumentos estabelecidos por governos anteriores - que chegaram a andar na casa dos 20 e tal por cento. Basta pesquisar no portal Prodata a evolução do salário mínimo nacional para se perceber o que acabo de dizer. Compare-se, por exemplo, o que se passou durante o chamado cavaquismo e no período costista. Entre os dez anos de governação social-democrata de Cavaco Silva (Novembro de 1985 a Outubro de 1995), o valor do salário de referência mínimo passou de 95,8 euros para 259 euros, o que corresponde a um aumento de 70,35% no período e a uma média aritmética anual de um pouco mais de 7%. Já entre 2015 e 2022, o período de governação socialista de António Costa, o mesmo indicador passou de 505 euros para 705 euros, um aumento global de 39,6%, correspondendo a uma taxa média anual de 5,65%, menor do que a conseguida durante o período de governação laranja. Apesar da narrativa socialista evidenciar que o crescimento do valor referencial mínimo para o salário que as empresas são legalmente obrigadas a pagar aos seus trabalhadores atingir os 50,5%, tal só se verificará em 2023, altura em que o crescimento médio anual dos salários com o governo socialista atingirá os 6,3%. Para que se concretizem aumentos equivalentes ou superiores aos que aconteceram no tempo do cavaquismo, o governo socialista tem de chegar-se bem mais à frente. Se no final da legislatura em 2026 o salário mínimo evoluir até os 900 euros, Costa apenas consegue igualar Cavaco Silva no que respeita ao crescimento médio anual daquele salário.
2. António Costa anda a perder as estribeiras com a direita, sobretudo, com a nova direita, que tem vindo a desmontar-lhe frequentemente a narrativa de que tudo vai bem e se recomenda. Primeiro, atirou-se ao Chega e, mais recentemente, também à Iniciativa Liberal (IL). Até já fez declarações destemperadas em relação a um presidente de câmara municipal. Tem usado linguagem deselegante e mesmo imprópria para alguém que tem as funções que tem. Um primeiro-ministro não pode dizer o que lhe vem à cabeça, sob pena de banalizar a função. E quem banaliza, descredibiliza. Anda irritado com tudo e todos e isso fá-lo transparecer os tiques de prepotência que já se lhe iam vislumbrando; mas também que o chefe do Executivo não está a encaixar o atrevimento certeiro daqueles dois partidos em mexer nas feridas do seu Governo, estragando-lhe sucessivamente a narrativa de que o país brilha cintilante na Europa e os portugueses estão a viver cada vez melhor.
Aproximando-se a passos largos as festividades natalícias, aproveito a oportunidade para desejar aos estimados leitores desta coluna de opinião um Santo e Feliz Natal.
Autor: Luís Martins