Há coisas tão simples na vida que mal lhe reparamos na importância que têm. Uma delas é o eufemismo na linguagem do nosso dia a dia. O eufemismo, figura de linguagem usada para suavizar uma expressão, é uma dessas que merece ser destacada. Mas, que não se pode separar da verdade pessoal e da sinceridade. Tanto dá para suavizar uma expressão, como para influenciar opiniões, como para suavizar uma atitude política, como ajuda as pessoas a aceitar uma mudança, como evita que determinada expressão seja tomada como mentira, como provoca revolta se for entendido como cinismo. Pesquisadores da Universidade de Waterloo (Canadá) verificaram que o uso de termos eufemísticos torna mais agradáveis as avaliações das pessoas, permite aos líderes políticos evitar custos de reputação quando são apanhados a mentir…
Experimentadores verificaram a sua virtuosidade para modificar a atitude das pessoas em situações negativas. Toda a gente tem histórias pessoais em que foi salvo pela virtuosidade de um eufemismo. Estou-me a lembrar de uma greve que terminou sem aumentos de salariais, apenas eufemisticamente mudaram o nome do trabalho: em vez de contínuos passaram a chamar-se técnicos auxiliares. Noutro caso, aconteceu o mesmo, bastando para isso mudar o nome do trabalho: em vez de constar que trabalhavam num matadouro, passou a dizer-se que trabalhavam numa fábrica de processamento de carne. Que é que mudou aqui? A imagem que tinham de si mesmos através do seu trabalho, que é um instrumento de prestígio e de promoção social.
Às vezes, há pessoas que criticam que “todos querem ser doutores”. Ser doutor é um título de prestígio social. Aspirar a ser reconhecido socialmente é positivo e é estimulante. Mas, o problema pode não ser esse. Pode ser inveja dos outros, porque se sentem inferiorizados e não conseguiram aquilo a que aspiravam; ou pode ser uma crítica a certas esquerdas frustradas que exigem para todos a mesma bitola social e não respeitam as diferenças, nem que a ciência já tenha demonstrado o contrário. Não podemos estandardizar tudo: cada um tem suas potencialidades e são essas que se devem esforçar por desenvolver.
Por outro lado, isto de querer vender o título de doutor a toda a gente também pode esconder negócios de amigos no ensino. Como faltam alunos capazes de seguir essa via, mete-se tudo lá e arranja-se emprego para os amigos como professores. Isso não é respeitar os legítimos desejos de promoção social, mas empurrar as pessoas para o sentimento de fracasso, porque depois vão sentir-se marginalizados, embora com o canudo na mão. O importante é desenvolver as suas diferenças de cada um para que ele se sinta socialmente integrado e respeitado. O título é importante, mas títulos há muitos… desde que traduzam competência, reconhecimento social e empenho. Quer isto dizer que não se pode desligar da formação da personalidade nem do respeito pelos outros.
No fundo, o importante é perceber que o eufemismo traduz uma forma de ser e de estar na vida: a gentileza e o bom relacionamento como forma de sociabilidade. Ninguém é perfeito e tudo se pode melhorar e até problemas sociais relevantes se podem resolver com um gesto sincero de reconhecimento dos problemas dos outros. Por outro lado, não podemos confundir eufemismo com mentira ou simples habilidade. Para além de habilidade, o sentido de eufemismo precisa também de humildade.
Destaque
Não podemos confundir eufemismo com mentira ou simples habilidade. Para além de habilidade, o sentido de eufemismo precisa também de humildade.
Autor: M. Ribeiro Fernandes