À hora em que escrevo este artigo, o governo acaba de decretar para algumas regiões do país a requisição civil dos camionistas de matérias perigosas, uma vez que não estão a ser cumpridos os serviços mínimos.
É verdadeiramente grave o que se está a passar já que o país corre o risco de ficar bloqueado, ou com a vida de todos nós muito dificultada, no caso de haver intransigência negocial quer da parte dos empresários, quer dos trabalhadores.
Já muito se escreveu e escreverá sobre a posição dos patrões e do sindicato.
A questão, verdadeiramente essencial, e longe do circunstancialismo atual é a seguinte:
Afinal, sendo o transporte de mercadorias perigosas essencial para a nossa Defesa Nacional, para a mobilidade do país, para nossa segurança energética, para a nossa segurança alimentar, para a nossa segurança no que diz respeito à saúde, não deveria existir lei especial para a greve na profissão de transporte de veículos de matérias perigosas de maneira a condicioná-la perante os valores em causa?
A que propósito é que se nega a uma classe de trabalhadores o direito à greve que, no atual quadro legal, também lhes é aplicada da mesma maneira que à generalidade dos cidadãos?
Esta intervenção musculada do governo só ocorre por esta grave omissão legislativa. Aliás esta atitude, quase ditatorial de um governo de esquerda - que teria todas as críticas hipócritas dos partidos da geringonça se fosse feita no tempo de Passos Coelho - nega um direito previsto na lei a um classe de profissionais que é igual a todas as outras.
A imposição de serviços mínimos entre 50% a 100% implica uma redução ou negação do direito à greve que os atuais trabalhadores dos transportes de matérias perigosas têm no atual quadro normativo.
Já nem falo em todo este teatro eleitoral, sintetizado com imensa piada por Susana Ruas numa rede social: “Não sei o que é pior, se a greve de abril que provocou o pânico, caos e estupidez, ou nesta em o governo provocou o pânico, caos e estupidez nos postos de combustível para impedir que a greve provocasse pânico, caos e estupidez nos postos de combustíveis.”
Este governo, governa há quase 4 anos, tem apoio alargado no parlamento e nunca lhe ocorreu que há uma lacuna gravíssima no que diz respeito à segurança do país, para então impor limites ao direito generalizado à greve para desta classe de profissionais, que no atual quadro normativo têm direito a ela como a generalidade dos restantes trabalhadores ?
Não estou a defender a posição do sindicato, nem dos patrões, ambos, respetivamente, com porta vozes ligados a estruturas partidárias, quer do partido que sustenta o governo, quer de outro partido que também concorre às eleições.
Apenas entendo que este governo, como aliás os governos anteriores, têm responsabilidade no que atualmente se passa, já que nunca olharem para este setor como deveriam, pelo menos no campo do direito à greve.
Apenas o governo da geringonça como está atualmente no poder tem responsabilidade atuais.
Aliás como o governo de Passos Coelho teve de governar submetido a um memorandum negociado pelo Partido Socialista e a Troika, também este governo negoceia com “memoranduns geringonços” assinados separadamente nas catacumbas do Parlamento com o PS e com o PCP e o Bloco de Esquerda separadamente.
A questão é que se há algo que carateriza o atual governo é que apenas tomou medidas constantes dos acordos com os outros dois partidos da geringonça abstraindo-se de governar segundo as necessidades do país.
Não nego a redução do desemprego e a reposição dos rendimentos, ambos já iniciado no tempo dos finais do governo de Passos Coelho (mas agora com o subsequente aumento de impostos). Não nego também o sucesso no controlo do nosso deficit, mesmo com as cativações.
No entanto, alguém consegue apontar alguma transformação estrutural ocorrida em Portugal e algum investimento público de monta ao longo destes 4 anos ?
No capítulo das leis do trabalho e na vertente da lei da greve, se os militares, os polícias, os juízes não têm direito à greve ou a têm fortemente condicionada, porque é que nunca o governo legislou no sentido de limitar também este direito aos trabalhadores que cuja atividade influencia fortemente a segurança nacional em várias vertentes?
Aliás o mesmo se deverá passar para alguns trabalhadores das áreas da energia, alimentar, da saúde, das forças da segurança, da proteção civil, dos sistemas de informação, transportes marítimos e aéreos, da segurança informática, etc..
Portugal tem uma grande lacuna neste domínio e uma se um dia ocorrer uma ação concertada com implicações graves em várias das áreas apontadas ocorrerá um problema ainda mais sério que o atual.
António Costa, como já provou no último capítulo da greve dos professores, é exímio em reagir a acontecimentos que, à primeira vista, dificultariam a ação do governo, transformando-o em autênticos sucessos eleitorais.
Ainda é cedo para apurar quais as consequências do que se está agora a passar – quer a nível da vida das pessoas, quer ao nível do resultado das próximas eleições - mas o problema concreto nos dias de hoje, deve-se apenas á ineficácia governativa da geringonça em qualquer reforma estrutural.
A imobilidade da legislação sobre o direito à greve é apenas uma das múltiplas confirmações da ineficácia governativa quanto à transformação estrutural do país para o seu pleno desenvolvimento.
Autor: Joaquim Barbosa