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A grande “mudança”

Sobretudo para uma grande parte dos jovens que nasceram na era das comodidades os quais se sentiriam analfabetos, especialmente sem as novas tecnologias. Para quem entrar, atualmente, numa antiga mercearia onde estivesse – atrás do balcão – um merceeiro de bata, com uns manguitos e um lápis atrás da orelha, estaria fora de questão. E, certamente, nem saberiam pedir as coisas sem, previamente, lhes pegarem.

Sem procurar desviar-me do tema que me proponho aqui tratar, assomou-me ao pensamento uma peça exibida na RTP, salvo erro no ano em que foi instituído o rendimento mínimo garantido, 1996 (hoje RSI), em que uma cidadã contemplada solidariamente com o mesmo, ao ser questionada sobre se vivia mais desafogada, respondeu: “até aqui vivi sempre com muita dificuldade e se não fosse o merceeiro, o leiteiro e o padeiro do bairro me fiarem – esperando pelo dinheiro – passava fome. Mas agora, graças a Deus, com este rendimentozinho meu e dos meus três filhos – já vou ao hipermercado abastecer-me para o mês”. 

Pois bem, citei este episódio – televisivo – apenas para servir de marco histórico ilustrativo de que, a partir dessa altura, estava consolidada a debandada para as grandes superfícies comerciais. Deixando em muito maus lençóis parte das lojas que comercializavam os produtos que os hiper e os supermercados passaram a exibir nas suas prateleiras. Assim aconteceu na cidade de Braga, em 1989, com a criação do primeiro hipermercado que viria a ser instalado na Quinta dos Congregados, a quem faltam dois anos apenas para completar três décadas. Pelo que foi impressionante a adesão, da população da nossa cidade e arredores, ao novo gigante das compras.

Mas a prova mais evidente da contínua massificação do consumo, em Portugal, são os 100 hipermercados e os 1860 supermercados de pequena e grande dimensão distribuídos, atualmente, pelas diversas regiões do país. É que só para termos uma ideia da correlação de forças, na estrutura de vendas a retalho, a quota de mercado do comércio tradicional, em 1985, situava-se nos 86%. Baixando, vertiginosamente, nos seguintes até se fixar no primeiro semestre de 2017 nuns modestos 9%.

Daí, a desertificação das cidades – com as lojas às moscas – e enchentes, quase diárias, nas chamadas catedrais do consumo, onde os portugueses gastam muito do seu tempo. É o custo a pagar pela revolução consumista que vem fazendo com que haja um supermercado em cada esquina do perímetro citadino como já sucede, também, na nossa Bracara Augusta.

Depois, surge o volume de negócios em que os portugueses entre janeiro e junho, deste ano, despejaram nesses monstros do consumo qualquer coisa como 8.967 milhões de euros dos seus rendimentos. Não só no segmento alimentar, mas também no não-alimentar, com um acréscimo de 3,8% face ao mesmo período de 2016.

Enquanto o crescimento do negócio com as vendas de equipamentos de telecomunicações situou-se, contas feitas, nos 17,1% e os eletrodomésticos em 10,1%, entre janeiro e junho do ano corrente, em relação ao mesmo período do ano transato. Decorrendo, daí, que a grande “mudança” de paradigma do consumo em todo o país esteja, praticamente, consolidada.

Ora, muito do êxito destas grandes lojas deve-se, sobretudo, ao facto de terem uma oferta cada vez mais diversificada de produtos; grandes descontos; promoções; preços baixos (que advêm da aquisição nos escalões máximos) e uma forte carga de publicidade. O ambiente climatizado, a possibilidade de compras em várias lojas numa só e o aparcamento gratuito respondem, obviamente, por essa mudança.


Autor: Narciso Mendes
DM

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18 setembro 2017