Isto tem acontecido mesmo em instituições cuja essência implica atividades eminentemente sócio-caritativas e que abrangem uma esfericidade, de per si, nobilíssima. Tudo isto vem a propósito da tão badalada polémica ocorrida na Cáritas Diocesana de Lisboa, nomeadamente a propósito de uma doação bastante avultada e a que certos Meios de Comunicação Social deram relevo, alguns dos quais até de um modo muito acintoso. Não é necessário ser muito inteligente para se detetar que aí está subjacente uma certa ideologia anticlerical de cariz bastante primário.
Não haverá quem dê o primeiro passo e tente desbloquear a problemática doação, tão bem intencionada na mente da autora e que atinge um valor de vários milhões de euros? Pelo que a imprensa e alguns responsáveis afirmaram, o litígio é de fácil solução. É que tais situações têm outras consequências laterais que se evitariam com o termo da contenda.
Nestes últimos peditórios, os grandes e dedicados voluntários que, à porta das superfícies comerciais e doutros lugares mais propícios a essa missão, recolhem donativos, tiveram de enfrentar referências jocosas (felizmente num número pouco significativo) à instituição que estavam a representar com muito zelo, coragem e amor. Não queiramos ser mais papistas que o Papa. Será que o espírito caritativo evangélico, sempre reproposto pelo nosso Papa Francisco custa tanto a praticar? Estaremos, de facto, a ir ao encontro das periferias?
Temos que pensar que as ideologias do ateísmo, do agnosticismo, do paganismo e do anticlericalismo estão numa fase de grande expansão, já que o ambiente político as favorece. A Igreja, na sua vertente caritativa, não pode permanecer apenas nas zonas de conforto, à espera que as pessoas venham ter com Ela. Todos nós, seus membros, devemos ir bater o terreno e verificar as grandes necessidades do povo. É do conhecimento de toda a gente que a pobreza envergonhada ainda predomina nas nossas sociedades.
A caridade é, por essência, uma ação de cariz eminentemente voluntário. No entanto, em certos casos, burocratizou-se demasiado, sobretudo numa certa elite dirigente. Há que corrigir estes pequenos focos, para que eles não contaminem a grande instituição que se mantém fiel à mensagem de Cristo. A humildade, a fraternidade, a dedicação desprendida e o amor ao próximo são marcas identitárias dos servidores da Igreja, devendo estar sempre disponíveis para ir ao encontro dos carenciados e de todas as pessoas que estão ávidas da Água Viva que é a única que pode saciar as samaritanas e os samaritanos de boa vontade.
Estas e muitas outras situações desviantes vão surgindo porque o mundo atual ainda não soube aproveitar plenamente os benefícios do avanço da tecnologia científica. Em vez disso, o que se vê é a proliferação de casos de desgraças que vem causando grandes malefícios, sobretudo na juventude incauta que tem caído nas várias armadilhas que, ardilosamente, lhes armam.
Na vida moderna, as oportunidades para adquirir e consolidar uma personalidade sólida e coerente são cada vez mais raras. As instituições tradicionais vocacionadas para o efeito estão um tanto degeneradas. Os seus objetivos, no seu conjunto, transformaram-se, em vários aspetos, em metas bastante formalizadas.
A sociedade atual precisa de muitos Padres Américos e de muitas Sílvias Cardoso. Procuremos dar o contributo que nos for possível, para que tais exemplos de amor ao próximo, nomeadamente aos mais abandonados, aos marginais e aos necessitados se multipliquem por esse mundo fora.
Autor: Artur Gonçalves Fernandes