Não obstante, Péricles soube, quase sempre, conduzir, «pela persuasão e com sentido pedagógico, o povo que o seguia de bom agrado» (Péricles 15.1). E mesmo quando via o descontentamento do povo, «retesava-lhe os freios e obrigava-o a agir de acordo com o que era do interesse público», acrescenta Plutarco, seu biógrafo. Com efeito, uma das causas do sucesso que granjeou entre os seus concidadãos foi a força do seu discurso, a sua arte de bem falar: «Mostrou que a eloquência é, como diz Platão (Fédon 271c-d), a arte de conduzir o espírito e que o seu principal papel é dar acesso aos sentimentos e às paixões, que são as cordas e sons da alma e que pedem um dedilhar hábil e harmonioso» (Péricles 15.2).
E logo acrescenta o historiador grego que, como já dizia Tucídides, a sua fama de estadista provinha sobretudo da «reputação da sua vida e do crédito de que gozava, como alguém manifestamente incorruptível e inacessível a subornos».
Pois bem. Com toda a certeza que muito ajudava o exímio orador a simplicidade exemplar que marcava a sua vida quotidianos; e com isso, sem dúvida, mais convincentes se tornavam as suas palavras aos ouvidos de quem o escutava. Conta Plutarco (Péricles 7.5) que Péricles «era visto, na cidade, a caminhar numa única rua, a que conduz à ágora e ao conselho; renunciou aos convites para banquetes e a todas as outras relações familiares e sociais, de modo que, durante todo o longo período de tempo em que esteve no poder, nunca foi jantar a casa de um amigo, excepto quando o seu primo Euriptólemo deu uma festa de casamento; mesmo aí ficou até às libações e saiu em seguida.
6. É que as festas são terríveis para manter a dignidade e é difícil conservar na convivência a seriedade que leva à boa reputação. Porém, a verdadeira virtude tanto mais bela é quanto mais evidente se torna, e, assim, nada nos homens superiores pode causar tanta admiração nos de fora quanto o seu dia-a-dia nos que com eles convivem».
Mas também os comerciantes da cidade elogiavam o hábil governo de Péricles. Com o advento do regime dos Trinta Tiranos imposto a Atenas por Esparta, em 404 a. C., as condições sociais alteraram-se de tal forma que a família de Lísias, residente na cidade, faz esta evocação da sua vida sob a democracia (Contra Erastótenes 4): «Meu pai, instado por Péricles, veio estabelecer-se nesta terra, em que habitou durante trinta anos. Nunca citámos, nem ele nem nós, ninguém em justiça e também não fomos acusados. Enquanto durou o regime democrático, vivemos de modo a não causar dano a outros nem a deles sofrer injustiça».
A esta luz se compreende o testemunho de Plutarco a enaltecer a obra de Péricles: «Assim, fez da cidade que recebeu forte, a mais forte e a mais rica, e ele próprio, no que respeita ao poder, ultrapassou muitos reis e tiranos. Várias de entre essas personalidades o designaram até como tutor dos seus filhos. Mas não acrescentou uma única dracma ao património que o pai lhe deixara» (Péricles 15.2).
Autor: António Maria Martins Melo