1 - Acaba de ser anunciada a criação de uma «autoridade contra a violência no desporto». E porque não uma «autoridade contra a violência doméstica»? Ou «contra a violência nas escolas»? Ou «contra a violência na estrada»? Ou «contra a violência nos bairros suburbanos»?
2 – Entre nós, quando alguma coisa corre mal, quando algo de novo ou algo de velho se torna particularmente evidente, logo se propõe um de dois remédios, quando não os dois ao mesmo tempo: a criação de um novo organismo estatal (remunerado, claro!) e/ou a elaboração de novas leis. Depois… fica tudo como dantes porque os novos organismos não aplicam as novas leis… nem as velhas.
3 – Para resolver o problema (real, grave, brutal) da violência no desporto basta que tribunais e, sobretudo, polícia apliquem com severidade, com rigor e sem qualquer espécie de excepções as leis que nos regem a todos – quer sejamos desportistas, adeptos deste ou daquele clube ou cidadãos alheios a desportos de massas.
4 – O que é urgente (e fundamental; e eficaz) é acabar com as excepções «porque é futebol», é acabar com o «fechar os olhos porque é futebol» ou qualquer outro desporto que, pela sua popularidade se julgue com direito a estatutos especiais que lhe permitam ignorar a lei.
Essa ignorância, ou essa violação, começa no estacionamento de automóveis, na vizinhança dos estádios, em cima dos passeios ou mesmo em auto-estradas onde também circulam impune e perigosamente peões-adeptos, passa pelo ruído de manifestações para além das horas em que é legalmente autorizado, passa pelo palavrão corrente diante seja de quem for, pelo empurrão, pelo encontrão ao transeunte pacífico, pelas punhadas (e pauladas) no carro do automobilista alheio ao acontecimento desportivo e chega ao insulto soez quando não à agressão física. E a tudo a polícia fecha os olhos e os ouvidos «porque é futebol».
5 – Em paralelo, há todo um mundo de negócios mais ou menos escuros, mais ou menos ilícitos ou, na melhor das hipóteses, mais ou menos duvidosos. E toda a gente (ou quase), tratando-se de futebol, acha normal o anormal. Ninguém mete a mão nesse vespeiro porque não quer sair picado e porque, sendo futebol… é normal… não vale a pena.
6 – Para sanar tudo isto não são precisas mais autoridades que, mais do que inúteis, serão nocivas. Basta que haja Autoridade – com A maiúsculo – que é uma virtude moral que o Estado não tem.
Porque a Autoridade não é atribuída por voto popular. Isso é Poder. A Autoridade conquista-se por um comportamento irrepreensível, coerente com os princípios proclamados e independente de simpatias e antipatias. Conquista-se ainda pelo exemplo – pelo exemplo deste mesmo comportamento.
Um Estado que não cumpre e não faz cumprir CEGAMENTE as leis que ele mesmo elabora, que, cedendo a populismos, abre, na prática, excepções simpáticas – é um Estado que a si mesmo se desautoriza perante os cidadãos. Isto é: não tem Autoridade, embora tenha Poder.
7 – Para resolver o problema da violência no desporto – e muitos outros – não são precisas mais autoridades. Basta que haja Autoridade – e que ela se exerça através do Poder.
Nota:por decisão do autor este texto não segue o impropriamente chamado «acordo ortográfico».
Autor: M. Moura Pacheco
A Autoridade e as autoridades
DM
24 maio 2018