O amor não está só na paixão ou no envolvimento carnal. Até porque, se a paixão cessa e o envolvimento acaba, o amor terá de perdurar. O amor não tem fim, limites ou «travões» (cf. 1Cor 13, 8).
Ele está igualmente no acolhimento, na presença, na estima, na escuta e na entreajuda: nos bons momentos e sobretudo quando sobrevém a provação.
É por isso que a amizade não é inferior ao amor. É por isso que a amizade também é uma forma de amor.
Não foi por acaso – nada é por acaso – que Luandino Vieira aglutinou os dois vocábulos no (feliz) neologismo «amorizade».
Sem amor, a amizade seria um equívoco, abastardando-se em mero «amiguismo». E o «amiguismo» é uma simulação da amizade, centrada no «eu» e nos seus interesses.
Os outros são «usados» quando convém. Satisfeitas as conveniências, extingue-se o que parecia ser amizade.
Na cultura grega – incorporada na mundividência cristã – a amizade («philia») faz parte do amor.
Este não descarta o «eros» (atracção física), mas tem o seu expoente máximo no «ágape» (amor que não selecciona nem estratifica; entrega-se todo a todos).
O padrão do «eros» é a atracção por alguém. Já o modelo do «ágape» é Jesus, que derrama o sangue pela humanidade inteira.
Curiosamente, C. S. Lewis acrescenta a este elenco o «storge» (amor fraternal, familiar).
Mesmo sem atracção física, o amor não se ausenta. É possível que até se torne mais sublime.
Amar os que não merecem ou os que não suscitam afeição não será o mais assombroso – e comovente – que pode haver?
É pena que nem todas as histórias de amizade corram bem e que algumas até terminem mal.
Sucede que, se terminam, é porque nunca chegaram a começar. Amigo uma vez tem de ser amigo sempre.
A doença e a adversidade costumam fazer uma (implacável) triagem na amizade.
Há quem se eclipse nessas alturas escorando-se nos expedientes mais insólitos. Mas também há quem surpreenda e emocione com os seus gestos e a sua persistente disponibilidade.
Os amigos das horas difíceis não são os melhores; são os únicos. São os que não vacilam, os que estendem a mão e escancaram o coração.
Por conseguinte e parafraseando Miguel Torga, diria que nada é tão encantador como ter um amigo.
Podem faltar palavras para trocar ou ideias para debater. Mas não falta aquele «fraterno abraço» com «um sol tépido a iluminar a paisagem de paz, onde esse abraço se deu, forte e repousante».
E isso não será a melhor cura para tantos males que nos vão despedaçando?
Autor: Pe. João António Pinheiro Teixeira