twitter

Um urgente alerta

Um estudo da Faculdade de Medicina da Universidade do Porto, publicado em abril do ano transato no Journal of Affective Disorders Reports, revelou que tem havido um aumento significativo de crianças e adolescentes que se automutilam, causando a si próprios danos corporais como cortes e outras lesões. Os autores referem que estes comportamentos em crianças e jovens dos 9 aos 24 anos, quer em contexto de internamento psiquiátrico, quer em ambulatório estão claramente associados à exposição às redes sociais e, segundo a Organização Mundial de Saúde (OMS), constitui um importante problema de saúde pública. O diretor desta organização para a Europa, Hans Kluge, chegou mesmo a alertar em comunicado que é necessário tomar medidas para levar as crianças e jovens a deixarem de utilizar as redes sociais que são responsáveis por os levar à depressão, à ansiedade e ao mau desempenho escolar. Os sintomas são algo semelhantes à toxicodependência, nomeadamente a incapacidade de se controlarem, de abandonarem e desistirem das atividades regulares em prol das redes sociais, com todas as consequências nocivas que daí advêm. 

Esta introdução vem a propósito de uma recente notícia que dá conta que a rede social TikTok foi processada por um grupo de sete famílias francesas que a culpa de prejudicar a saúde mental dos seus filhos, conduzindo dois deles ao suicídio. Estas famílias, agrupadas na associação Algos Victima, acusam o TikTok de expor crianças e jovens a inúmeros vídeos que promovem suicídio, automutilação e distúrbios alimentares. O seu objetivo é conseguir o reconhecimento da responsabilidade daquela rede social na deterioração da saúde mental das suas crianças e jovens. Duas cometeram suicídio quando tinham 15 anos, quatro tentaram pôr termo à própria vida e uma sofria de anorexia.

Apoiados por vários estudos que referem o TikTok como viciante e capaz de conter conteúdos nocivos para a população mais jovem, que pela sua natureza é mais vulnerável, as sete famílias representadas pela advogada, Laure Boutron-Marmion, exigem que a referida rede regule os vídeos de forma mais eficiente, de modo a que os menores estejam mais protegidos, pois acreditam que aquela plataforma cometeu um crime grave ao não moderar o conteúdo referente a suicídio, automutilação e distúrbios alimentares.

Começa a ser do senso comum que a exposição a écrans por tempo excessivo de crianças e jovens é extremamente prejudicial. Há já diversas instituições de ensino onde o uso de telemóvel começa a ser limitado e regulado para aquilatar desta verdade insofismável.

Atenda-se ao estado da saúde mental das crianças e jovens nos últimos anos e procurem-se as causas para a significativa degradação da mesma e encontraremos as razões no exagerado uso de telemóvel nas suas variadas funções, onde se incluem a navegação na internet e a presença nas redes sociais.

Atente-se às mudanças ocorridas nas últimas décadas na infância e na adolescência, onde as brincadeiras e os jogos ao ar livre foram progressivamente substituídos pelas consolas, telemóveis e afins, e aí encontraremos as razões de tanta ansiedade, depressão, privação do sono, hiperatividade, défice de atenção e outros distúrbios tão comuns no tempo presente.

No seu livro A Geração Ansiosa, o psicólogo social americano, Jonathan Haidt, explica com notável minúcia como a “reconfiguração da infância” ocorrida nas últimas décadas, a internet e as redes sociais moldaram as novas gerações e as levaram ao aumento expressivo de problemas do foro mental. O autor explana com particular clareza a razão que leva as raparigas a serem mais prejudicadas pelas redes sociais do que os rapazes e porque estes se retiram frequentemente para o mundo virtual com consequências nefastas para os próprios, suas famílias e sociedade. Por fim, aponta os caminhos que pais, professores, escolas, empresas tecnológicas e governos devem seguir para pôr termo à deterioração da saúde mental das crianças e jovens e lhes devolvam uma vida mais saudável, mais livre e mais feliz.

É também neste sentido que aqui deixo este urgente alerta.

J. M. Gonçalves de Oliveira

J. M. Gonçalves de Oliveira

28 janeiro 2025