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No Século Segundo havia “bispas”, “presbíteras” e “diaconisas”

Falarei hoje de um tema que merece muita deferência, sobretudo por se estar a falar de um sexo feminino que, talvez, representará 70% dos cristãos praticantes e ativos nas nossas comunidades. Um sexo que aspira por um reconhecimento eclesial mais vivo e consequente das suas capacidades (particulares ou não) pessoais. A saber: o mito que a Igreja esconde o facto de no, séc. II, ter havido mulheres que foram “diaconisas”, “presbíteras” e “bispas”.

Dito isto, devemos ser sérios com a verdade tal como ela pode ser dita, mas com segurança histórica. E esta, em muitos aspetos relacionados com o tema deste artigo, é exígua.

Pois bem, não é segredo nenhum que na parte final da sua “Carta aos Romanos” São Paulo se refere a uma pessoa de nome “Júnia” em associação com o termo “apóstolos” (cf. Rm. 16,7). Mas o ser “apóstolo” significa apenas “ser enviado”, sem que tenha, ao contrário dos “Doze” (o grupo de apóstolos mais próximos de Cristo e que foram, segundo a tradição da Igreja, os precursores dos bispos), uma conotação sacerdotal. Mais: tão pouco se sabe se está a dizer que “Júnia” é “uma entre os apóstolos” ou se é “famosa entre os apóstolos”.

Já antes, em Rm. 16,1s, São Paulo refere uma mulher de nome “Febe” a quem denomina de “diácono”, mas sem sabermos se este termo se reporta a uma mera “servidora” (etimologia de “diácono”), ou se o seu serviço, que é vincado como também sendo o de “benfeitora”, implicaria um estatuto de ministério estável, como era e será assaz característico dos “diáconos” e de outros ministérios que surgiram e surgirão na Igreja.

Também em 1Tm. 3,8-11 se fala em “mulheres” após a se ter falado em varões “diáconos”. Contudo, não se sabe se tais mulheres são as esposas dos “diáconos”, ou se a referência é apenas um acrescento, particular aquelas, das qualidades que um “diácono” deve possuir.

Seja como for, não se pode colocar em causa que tenham existido mulheres “diaconisas” (numa altura que o diaconato ainda não era pressuposto para o presbiterado), talvez mesmo a partir de meados da primeira parte do séc. II, no Ocidente e no Oriente. No Oriente (mas não no Ocidente) tais diaconisas recebiam a consagração de bispos por oração e imposição das mãos, assumindo, em especial, os encargos de: 1) estarem particularmente atentas às necessidades materiais e espirituais das viúvas e das virgens; 2) darem instrução às mulheres antes e depois destas receberem o Batismo, durante o qual as ungiam, mas não as batizavam propriamente. Já no Ocidente (mas não no Oriente) as diaconisas, embora não sendo ordenadas daquele modo e ainda que assumindo encargos análogos aos apontados precedentemente, batizavam efetivamente as mulheres (mas não os varões).

Já no fim do séc. II, parece ter-se começado a usar os termos “bispa” e “presbítera”, todavia é provável que isto sejam mais referências às esposas dos “bispos” e dos “presbíteros” do que propriamente a mulheres que atuavam como “bispas” e “presbíteras”. Pese embora tudo isto, é verdade que em séculos posteriores houve mulheres que atuaram daquela forma em situações minoritárias e de difícil compreensão a nível da sua ligação à “Grande Igreja”.

Em suma: no séc. II, diaconisas mas com algumas distinções eclesiais face aos diáconos, sim; presbíteras e bispas aceites pela “Grande Igreja”, de certeza que não. Talvez aqui voltemos.

Alexandre Freire Duarte

Alexandre Freire Duarte

4 dezembro 2024