A mais dolorosa inversão deste nosso tempo: em vez de estarmos «juntos com os solitários», tornamo-nos simplesmente «solitários juntos» (Zigmunt Bauman).
Nunca tantos estiveram tão perto. E, apesar disso, não conseguimos estar próximos.
Em qualquer lugar – e praticamente a toda a hora –, formamos «ajuntamentos».
Mas trata-se de «ajuntamentos anónimos», fugazes. Não deixam raízes. Só derramam sensações de enfado, angústia, torpor.
No fundo, sentimo-nos cada vez mais distantes, mesmo em multidão.
E, quando acodem ao aconchego da sua habitação, muitos são os que por companhia continuam a ter a solidão.
Estamos cada vez mais apartados? Dá-se até a (penosa) ironia de os conglomerados de moradias dos nossos dias terem o nome de…«apartamentos».
Não é apenas para realçar a autonomia de cada unidade habitacional. No fundo, quem está «apartado» é o ser humano.
A própria linguagem nos delata. Não faria mais sentido que os nossos domicílios fossem autênticos «ajuntamentos» e não desoladores «apartamentos»?
Que relação temos com o vizinho do lado ou com o inquilino da frente? O mais frequente é passarmos por ele em passo estugado, trocando – quando muito – uma acelerada saudação.
O comportamento pode considerar-se civilizado, pautado por uma «aristocrática indiferença».
Já não é mau quando ninguém molesta ninguém. Mas quem se preocupa com a situação daqueles que, afinal, (sobre)vivem debaixo do mesmo tecto?
Não raramente, porém, chegamos a viver «apartados» dentro de cada…«apartamento». Será para fazer jus ao nome?
Saímos cedo e depressa. Regressamos tarde e cansados. Umas breves palavras é o máximo que se permuta?
Quando encontramos a solidão – quiçá num compartimento esquecido do nosso ser –, o primeiro impulso é fechá-la. Sucede que, em muitos momentos, é ela que mais nos acompanha.
Por opção, alguma solidão até conforta, até permite chegar a profundezas que, de outra forma, nos estariam vedadas. O problema é a solidão por condenação, por desinteresse, por sobranceria, por ingratidão.
Não será possível transformar os «apartamentos» em «ajuntamentos»?
Custará muito perceber que viver é conviver? Não condenemos ninguém ao abandono.
Estendamos a mão, acendamos um sorriso, disponhamo-nos a enxugar uma lágrima.
Enfim, não adiemos o paraíso para depois. E, acima de tudo, não o pretendamos arrebatar só para nós. No Céu, não há «apartamentos». Por isso é que nele mora a felicidade sem fim!