Porventura mais do que a maioria das nações, o nosso país é marcado por muitas épocas ou estações que nos afligem.
Há a expectativa de que a “época de incêndios” – rodeada de forte constrangimento climático, é certo –, sempre marcada por dramas e atribulações (neste ano, há já a reter o penoso acidente de helicóptero que vitimou quatro agentes da GNR), esteja a caminhar para o final.
De há uns anos a esta parte, também a crise nas urgências hospitalares durante o verão deixa muitos portugueses deveras ansiosos, mormente as grávidas. E sobra ainda uma terceira estação ou crise cíclica, sobre a qual me proponho envolver o leitor numa breve reflexão. Refiro-me às carências e problemas que assomam no começo de cada ano letivo.
Mais sonoramente, por esta ocasião emerge a carência de professores em diversas escolas da rede pública de ensino, da qual resulta, inevitavelmente, um potencial agravamento das condições de aprendizagem para os alunos envolvidos, e uma perda de importância da escola no seu requerido papel de “elevador social”. As causas do fenómeno estão sobremaneira identificadas: remunerações pouco competitivas, prolongada itinerância em postos de trabalho distantes a impor custos acrescidos (segunda habitação), a crescente indisciplina evidenciada por muitos alunos e, como corolário, a desvalorização social da profissão docente. Ainda que o fenómeno não seja um exclusivo português, perante um sistema de ensino muito centralizado cabe ao governo da República uma responsabilidade maior na procura de soluções. O atual Ministro da Educação parece querer mexer algo mais do que o habitual, falta saber se será o bastante.
Avancemos, porém, para o ponto fulcral desta crónica. Um conjunto de mães professoras, na sequência do lançamento de uma petição pública relativa ao assunto, instou por estes dias o Ministério da Educação a adotar medidas para travar os prejuízos resultantes da utilização crescente do digital e dos telemóveis na sala de aula, como no contexto escolar em geral, pelos estudantes juvenis. Não é a primeira vez que aqui trago o assunto, todavia, face à gravidade do mesmo, impõe-se reincidir.
É um facto que a escola assume também um relevante papel de guarda, permitindo o sossego de muitos pais que, de outro modo, não saberiam como cuidar dos seus filhos menores durante as jornadas de trabalho que enfrentam no quotidiano. Todavia, para lá desta função de guarda, e par de um espaço de socialização, todos concordarão que à escola cumpre, particularmente, alavancar o futuro dos jovens através da promoção da aprendizagem de saberes curriculares diversos.
A corrente frenadora do livre porte do telemóvel por parte dos alunos em contexto escolar é, por agora, minoritária em Portugal. Escudada em algumas opiniões permissivas para com o seu porte e uso – como poderia não haver? –, hesitante perante a relativa novidade do assunto e evidenciando uma aura de democraticidade, a tutela superior do Ministério da Educação tem deixado ao livre-arbítrio da direção das diferentes escolas a adoção de medidas, ou a comum omissão, no caso vertente. Deste modo, a liberdade concedida está a ser cúmplice do crescimento da indisciplina dos alunos em muitas salas de aula, da consequente ineficácia de muitos tempos letivos e da pobreza da sociabilidade juvenil.
Quanto aos alunos, e sobretudo os que evidenciam pior aproveitamento, não será difícil ao leitor antecipar que agradecem a tendencial permissividade instalada. A digitalização dos manuais escolares e o livre porte de telemóveis, no ambiente escolar, tem vindo a merecer recentemente limitações, etariamente graduadas, noutras geografias, desde a Suécia à França, por exemplo. Seria bom estarmos atentos a esta aparente vaga “saudosista”, que, afinal, pode ser amiga do futuro dos jovens.
Concedamos, os telemóveis também podem servir para animar atividades em contexto de sala de aula. Mas neste caso, em nome da sanidade mental e de uma boa sociabilidade, nunca ignorando a idade e maturidade dos alunos, e, em qualquer caso, nunca como uma muleta omnipresente da aprendizagem, questionadora, afinal, do papel que também incumbe aos docentes.