O designer Luís Louro chamou-lhe Inteligência alheia e bem ao que todos conhecemos como Inteligência Artificial degenerativa. De uma maneira ou de outra, a capacidade de agregar e criar a partir do que existe a aparência de algo novo, é uma característica que nos fascina, ganha cada vez mais adeptos, conseguindo, simultaneamente, ser o elo da cadeia que nos habilita a ser preguiçosos, a deixar de usar a memória e, por conseguinte, a tornar os seres humanos escravos de um conhecimento artificial que não passa, na maioria dos casos, de um expediente que nos habilita a uma excessiva dependência e à perda de capacidade crítica sobre tudo o que nos rodeia. Se a memória é o resultado da nossa consciência ao longo do tempo, ela é, simultaneamente, a única que expressa a forma distinta que nos habilita no quotidiano a ser diferentes; construtores de experiências e habilidades na base do viciante estímulo que constitui a necessidade. Com o historial que a “Inteligência artificial” já tem no seu curto tempo de vida, é cada vez mais claro que, por muito que se regule, podemos estar a caminhar para a extinção da natureza da nossa consciência. Os seres humanos foram capazes de se reinventarem na base do conhecimento, empírico ou científico ao longo de milhares de anos, mas nunca tinham experienciado uma forma lúdica de destruírem o seu ADN. Imagino estar numa sala de aula em que é apresentada uma matéria nova que temos de perceber, assimilar e saber usar. A partir da IA e de uma base de alegada informação correta, presumimos que já não precisamos nem de decorar nem de perceber muito sobre a matéria, construindo, sempre com a inteligência da “pessoa tecnológica”, uma nova realidade, um presumível e sofisticado enredo de novas descobertas. Acreditando que a máquina nos pode substituir, o ser humano perde a capacidade de se motivar e com isso, o domínio da consciência moral, dos valores e dos princípios que estabelecem balizas e nos expurgam de desequilíbrios constantes. É verdade que a Natureza sempre encontrou um caminho para corrigir os nossos desmandos, por vezes, de forma radical como está a acontecer com as alterações climáticas, mas nunca atingiu, de forma tão brutal, a essência do ser humano como a IA. Se enveredarmos pelo caminho mais curto, para uma pretensa felicidade que acabe com “a canseira” do conceito de trabalho que temos hoje, o risco de perdermos o controlo será agravado por uma luta constante e sem regras entre o Ser e o Ter. Hoje, ainda temos a consciência que nos limita a ação; amanhã, sofreremos da nossa paixão pela preguiça. Eis porque vale apena continuar a pensar, beber do conhecimento consolidado, transformando-o em bem comum com novas descobertas, novos saberes. A IA parece ser muito útil para nos substituir em tarefas árduas ou de precisão, mas será sempre mais perigosa que o percurso que temos feito em busca do desconhecido que tem permitido à humanidade encontrar as respostas que a cada tempo vai precisando. Há cerca de dois anos, numa conferência sobre os perigos da IA para a Democracia, realizada em Braga pela Comissão de Homenagem aos Democratas de Braga, ficou claro que esta podia ser posta em causa pela falsa sensação de conforto que esta aparentemente proporciona, mas que não deixa de ser um ataque à consciência e ação política dos cidadãos. Como estamos perante um mundo novo, que supera a nossa capacidade de assimilação, a Inteligência Artificial pode manipular os nossos desejos, as nossas qualidades humanas e técnicas e apresentar soluções erróneas, a partir de dados publicados na Internet. Basear as nossas decisões em informação alheia que mais não é que a recolha de informação pré-publicada, é um tiro no escuro que, tal como a espada de Dâmocles, nos conduz ao perigo e à danação iminente perante o poder de uma Inteligência que caminha a largos passos para se substituir ao domínio dos cidadãos sobre o seu destino.