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Quatro dias por semana

“A busca da felicidade – afirma o Papa Francisco – é comum a todas as pessoas de todos os tempos e de todas as idades” porque o próprio Deus colocou “no coração de cada homem e de cada mulher um desejo irreprimível de felicidade” e “de plenitude”. A felicidade é tema dos livros do Papa, como a “Felicidade nesta vida” e mais recentemente o “Ti voglio felice. Il centuplo in questa vita”. 

A vida terrena é curta, efémera, a doença aparece-nos quando menos contamos, em qualquer idade. O genial compositor Pergolesi faleceu, ainda muito jovem, aos 26 anos, mas a tempo de compor – poucas semanas antes, no ano de 1736 – a mais primorosa de todas as “stabat mater”, a dolorosa – “Em pé, a Mãe dolorosa, chorando junto à cruz da qual pendia seu Filho….”, eterna e inigualável, tal como o “Requiem” de Mozart, não haverá outro igual, também escrito ao tempo do seu decesso, igualmente novo, com apenas 35 anos de idade. Que obras teriam ainda criado se tivessem chegado aos 65 anos de idade, do outro grande génio do barroco Johann Sebastian Bach?

É neste contexto que surge como muito interessante o estudo recentemente apresentado, relativo ao projeto-piloto que estuda a semana de quatro dias, revelando que é positiva para os trabalhadores e não prejudica a economia. 

A criação da semana de trabalho de 40 horas, nos Estados Unidos, embora pareça surpreendente, começou logo no século XIX. No início desse século, ainda no período da revolução industrial, as pessoas trabalhavam de 80 a 100 horas semanais. Na segunda metade do século, em 1869, o presidente Ulysses S. Grant emitiu uma proclamação para garantir jornadas de trabalho de oito horas para funcionários públicos, o que encorajou os trabalhadores do sector privado a lutar pelos mesmos direitos. Em maio de 1886 surge a Revolta de Haymarket, na cidade de Chicago, fruto da luta em prol da jornada de oito horas de trabalho por dia e cuja violência levaria à consagração do primeiro de maio como dia internacional dos trabalhadores. Em 1926 Henry Ford popularizou a semana de trabalho de 40 horas depois de descobrir, por meio da sua pesquisa, que trabalhar mais produzia apenas um pequeno aumento na produtividade, mas que durava um curto período de tempo. Outras empresas rapidamente seguiram o exemplo de Henry Ford, depois de verem como esta nova política aumentou a produtividade e fomentou a lealdade e o orgulho entre os funcionários da Ford. Em 1940 a semana de trabalho de 40 horas tornou-se lei dos EUA.

Os menos novos certamente que se lembram da semana inglesa, expressão popularizada sobretudo no comércio, referindo-se à jornada de trabalho de oito horas de segunda à sexta-feira e de quatro horas pela manhã do sábado, sendo, o descanso no sábado a tarde e no domingo, totalizando 44 horas semanais.

As introduções das novas tecnologias, mais agora com a IA, assim como um desejo crescente pela qualidade de vida, permitiram a redução da carga horária para 40 horas ou 35 horas semanais, sendo a semana de 4 dias uma evolução natural na história do período laboral. Pouco importam as considerações ideológicas marxistas ou capitalistas para a solução, se resultam de verdadeiras conquistas dos trabalhadores ou meras consequências do interesse dos empresários, não só em alcançar mais produtividade, como em libertar dias para os trabalhadores gastarem o seu salário em lazer, proporcionado por bens de consumo disponibilizados por outras atividades criadas pelos patrões, no turismo ou restauração. O que importa é que o relatório final mostra benefícios para a saúde mental e uma melhoria na conciliação entre a vida pessoal e o trabalho.

De acordo com o documento, as empresas mantém os lucros, com melhor ambiente, menos stress, menos faltas ao trabalho, com os trabalhadores menos exaustos e mais produtivos. "A ideia de a sexta-feira ser o novo sábado é ainda muito remota” diz o estudo, estimando que para ser implementada a semana de quatro dias é necessário, no mínimo, 10 anos o que, afinal, nem é muito. 

E se contribui para a felicidade da maioria, é positivo. Afinal, como lembra Francisco, não fomos feitos apenas para trabalhar, mas também para a festa, e Deus alegra-se quando celebramos juntos como irmãos na simplicidade.

Carlos Vilas Boas

Carlos Vilas Boas

27 junho 2024