Neste tempo da mobilidade sem freio, da hiperactividade e da pressa, passamos a vida a sair: a sair de casa e a sair de lugares.
Falta-nos, no entanto, sair de um «lugar»: do «eu». Corremos para fora de tudo, mas teimamos em não sair de nós.
Em qualquer parte, conflituamos, agredimos, violentamos e até matamos.
Existir deixou de ser coexistir. Parece que deixamos de saber estar com os outros. Já só saberemos pisar os outros?
Curiosamente, os Seus coetâneos chegaram a alegar que Jesus estava «fora de Si» (cf. Mc 3, 21).
Acontece que, sem querer, estavam a fazer-Lhe um grande elogio e gravar uma enorme verdade.
Efectivamente, Jesus viveu sempre «fora de Si». O centro de Jesus nunca esteve em Si. Jesus foi alguém – verdadeira e profeticamente – «excêntrico». O centro de Jesus é o Pai e a humanidade.
Foi por isso que Jesus entregou a Sua vida ao Pai. Foi por isso que Jesus entregou a Sua vida pela humanidade. Eis o que falta, eis o que urge: hoje e aqui, é fundamental estar «fora de si».
O nosso maior problema é quando nos centramos nos nossos problemas. Ao contrário de Jesus, nós vivemos muito voltados para nós. Estamos muito «ego-centrados», muito «ego-sentados».
Com efeito, a revolução individualista desencadeou uma cultura egocêntrica e uma mentalidade egolátrica. O «eu» está no centro ou em cima. O outro encontra-se atrás e em baixo.
É certo que nunca estivemos tão perto dos outros. Mas também é verdade que nunca nos teremos sentido tão distantes dos outros.
O mal não é ser diferente. O mal é passar a ser indiferente. Infelizmente, estar perto nem sempre costuma equivaler a ser próximo.
Eis a síntese do nosso tempo: tanta gente perto; tanta gente só. Todos vivem ao lado de todos. Mas ninguém parece saber de ninguém.
Aos olhos de muitos, será que alguém é mais que ninguém?
É óbvio que, no tropel de mudanças que estão em curso, o «eu» ganha muito. Mas arrisca-se a perder o mais importante.
A lógica do lucro valoriza a transacção comercial e subestima o serviço gratuito.
Ainda há muitos que servem. Mas são cada vez mais os que se servem. Servir está a ser um verbo cada vez mais reflexo.
Para não poucos, servir é, acima de tudo, servir-se.
É urgente perceber que nada somos sem os outros. Inferno não são os outros. Inferno é viver sem os outros, contra os outros.
Era bom que percebêssemos que existir é nunca desistir, é nunca desistir dos outros.