Há razões legítimas e objetivas para crer que a sociedade civil está a responder positivamente aos impulsos que a colocam num novo patamar da participação cívica. Em três atos eleitorais, mostraram a diferença ao participarem em maior número nas eleições. As europeias não foram indiferentes a esta nova disponibilidade dos cidadãos que se sentiram motivados para votar com a digitalização dos cadernos eleitorais. Coisa diferente poderia ter acontecido se houvesse vontade de ir mais longe, mas com a atual Comissão de Eleições é de esperar mais do mesmo, ou seja, nada. As eleições para os órgãos da CNE vão realizar-se na próxima quarta-feira, na Assembleia da República, não sendo de esperar, para além da indicação de nomes, que haja coragem para tornar útil um órgão que tem sido uma nulidade na defesa da participação cívica ativa. Se houvesse um pingo de vergonha na cara dos representantes do PS e do PSD, estes ter-se-iam demitido, à luz da dignidade, no rescaldo das eleições legislativas de 2022 em que a repetição das eleições para os eleitores a residirem na Europa foi um prego no caixão da sua já débil credibilidade. O papel da CNE, enquanto organismo independente, a funcionar junto da Assembleia da República, não se pode limitar à organização dos atos eleitorais com o mesmo padrão e modelo como se estivéssemos parados no tempo. Basta olhar para o mapa das mesas de voto. Com honrosas exceções, votamos da mesma maneira e nos mesmos locais, sem ter em atenção a mobilidade e a concentração das pessoas em determinados territórios. Veja-se o caso da freguesia de S. Vítor, em Braga, com cerca de 30 mil eleitores que apenas dispõe de um espaço onde se concentram algumas dezenas de mesas de voto. O envelhecimento da população ali residente, aliado a um local sem condições de acesso e longe das residências de uma parte significativa da população, não é um convite à participação cívica. É incapacidade e falta de bom senso. Se esta realidade perdura, por demasiado tempo, a falta de um plano estratégico para uma campanha de sensibilização – não bastam cartazes nem publicidade nos Órgãos de Comunicação Social – é tão gritante que é legítimo perguntar o que querem os partidos fazer da CNE, que tem sido o bobo da corte no jogo partidário e a quem a AR não dá a importância devida, deixando tudo como está? Não será tempo de transformar aquele órgão em algo mais útil do que (des)coordenar os atos eleitorais? – O que deveria ser um papel de liderança e fundamental na campanha de sensibilização dos cidadãos, é apenas o espelho da inércia, da institucionalização eleitoral de uma Comissão que perdeu a sua autoridade. Que importa, se os candidatos ou os seus partidos, violam as leis eleitorais, se ninguém liga patavina ao que diz a Comissão. Nas eleições do dia 9, repetiram-se alguns atropelos à Lei Eleitoral. Nem o Governo ou os candidatos respeitaram as suas decisões e nem por isso, os seus responsáveis protestaram ou fizeram valer as suas decisões. Num estado de Direito, seria desejável que do lado dos prevaricadores, houvesse bom senso pelo respeito das suas decisões, mas são os mesmos partidos – do arco da governação – a ditarem a regra da Indiferença, sempre que furam as regras. Se assim é, se reconhecem que o Órgão está decrépito e não responde às necessidades que ultrapassam o mero calculismo político, não está na altura de rever e refundar um Órgão que não prestigia a sua função nem se dá ao respeito? Os partidos têm, mais uma vez, a palavra que, adivinha-se, vai limitar-se à indicação dos nomes para novo mandato. Os cidadãos, esses, estão paulatinamente a regressar às urnas que é seu dever e não parecem preocupados com o futuro da CNE. Numa sociedade avançada e capaz, madura e proativa, o escândalo de que se reveste a ação da Comissão, teria tido uma saída airosa: a demissão e responsabilização dos seus responsáveis pela incapacidade de cumprir e fazer cumprir o que dita a lei e o bom senso.