twitter

Eleições Europeias

1. No dia 9 de Junho, os cidadãos dos 27 Estados-membros da União Europeia (UE) irão às urnas para eleger 720 deputados ao Parlamento Europeu (PE), para representarem 450 milhões de pessoas, cabendo aos portugueses eleger 21 deputados. No PE, os eurodeputados serão depois distribuídos por “famílias políticas” europeias, ou seja, pelos agrupamentos partidários mais afins ao que foram eleitos no país de origem (e não pela nacionalidade). Não são estritamente eleições europeias, pois tal implicaria, por exemplo, que poderíamos votar em toda a Europa em listas transnacionais comuns; são 27 eleições nacionais, organizadas ao mesmo tempo, mas separadamente em cada um dos 27 países; talvez por isso as questões europeias são frequentemente eclipsadas pelas lutas políticas internas dos Estados.

2. É verdade que o PE é a instituição da UE que mais competências foi obtendo com os sucessivos tratados europeus; se, em 1979, era mais um órgão consultivo, foi-se aproximando dum verdadeiro parlamento, com competências legislativas, orçamentais e de supervisão; e se, ao contrário do expectável, não tem per se iniciativa legislativa (pertence à Comissão Europeia), participa na elaboração da maior parte da legislação comunitária, em conjunção com o Conselho de Ministros (europeu) – processo chamado de co-decisão; e compete-lhe ainda escrutinar tanto a Comissão Europeia como o Conselho Europeu, o Conselho de Ministros e o próprio BCE. Note-se ainda que os Comissários, antes de nomeados, são chamados ao PE e interrogados para se aferir dos respectivos perfis de adequação, um processo que poderia bem ser imitado, para os ministros, nos Estados-membros. Portanto, o PE já não é um local de discursos simbólicos, mas uma instância primordial onde todos os dias as leis europeias que influenciam as vidas de 450 milhões de cidadãos são discutidas em 24 línguas oficiais, alteradas e depois votadas.

3. Há os que irão votar porque estas são as mais importantes eleições na história do PE (o primeiro sufrágio foi em 1979), há os que as consideram mais importantes que as eleições legislativas nacionais, há os que as tomam como eleições de segunda ordem. No entanto, o inquérito de Primavera do PE indica que 9 em cada 10 portugueses consideram que votar nas próximas eleições europeias é ainda mais importante pela actual situação geopolítica, o que converge com a média europeia (81%), pela guerra na Ucrânia e no Médio Oriente. Este é um dos graves problemas a enfrentar; nas palavras de Mark Leonard, há dias em Lisboa, "a União Europeia (UE) está a atravessar um processo de transição de um “projecto de paz” para um “projecto de guerra”; de facto, a invasão da Ucrânia abriu uma crise tal que a evidência levou a um processo de rearmamento forte em curso em muitos países; além disso, num passado recente julgava-se que "as fronteiras tinham pouca importância e que o projecto europeu era acabar com elas": "tínhamos a ideia de que havia a UE, a Rússia e uns países entre ambas"; ora a existência de fronteiras está a tornar-se uma “questão existencial” na UE.

Há um outro problema momentoso, o da entrada irregular e maciça de imigrantes nas fronteiras externas da UE, cujos fluxos engrossam uma espécie de ‘cavalo de Tróia’ onde todos cabem. Se a Europa é hoje um espaço privilegiado de fluxos migratórios, sendo, para muitas populações, a “terra prometida”, a contínua e forte pressão é já insustentável, pois atenta contra a segurança (como diariamente se vê), arruína os recursos (já muito exauridos) e mina a coesão social (diferenças antagónicas culturais e de costumes, por demais patente em várias sociedades).

4. Outra referência é que 82% dos portugueses inquiridos consideram que a actividade da UE tem impacto na sua vida quotidiana, um valor até mais elevado que a média europeia (73%). E, quanto ao futuro da UE, emergem como primeira prioridade a defesa e a segurança, seguindo-se as questões energéticas e as relativas à agricultura.

São, portanto, eleições das mais importantes. Acresce que tudo o que Portugal tem hoje, desde 1986, muito se deve à UE. Entre 1986 e 2011, houve 80,9 mil milhões de euros em fundos estruturais e de coesão (mais de 9 milhões de euros por dia), que saíram dos bolsos de contribuintes europeus. Para além das verbas vultuosas actuais, há 23 mil milhões de euros para financiar ‘Portugal 2030’, que podem erguer um Portugal paradisíaco se forem bem utilizadas. Existe um antes e um depois da adesão de Portugal à UE. As próximas eleições são até mais importantes que as nacionais.

Que o UE, e o PE, valorizem o que têm de tão atractivo – a democracia, as liberdades, maior igualdade. Como advertiu T.S. Eliot, "é necessário ser claro quanto à distinção entre a organização material da Europa e o organismo espiritual da Europa. Se este último morrer, então o que organizarem não será a Europa, mas apenas uma massa de seres humanos que falam várias línguas diferentes."

O autor não escreve conforme ao denominado acordo ortográfico.


 

Acílio Estanqueiro Rocha

Acílio Estanqueiro Rocha

5 junho 2024