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O «personal trainer» espiritual

Ao «exercício físico» não basta ser feito; tem de ser bem feito. E muitos já chegaram à conclusão de que, por si mesmos, não o conseguem fazer adequadamente.
Daí o recurso, cada vez mais reiterado, ao «personal trainer». As suas indicações são escrupulosamente seguidas para que os objectivos sejam alcançados.

Será que, por nós mesmos, saberemos fazer «exercícios espirituais»? Caberia até perguntar: será que os fazemos com a mínima assiduidade?
Neste tempo apressado, fazemos poucos «exercícios espirituais». E, como alerta São Paulo (cf. Rom 8, 26), nem sempre os fazemos bem.

Admitamos que não se respira muita espiritualidade nos espaços religiosos. A agitação, o ruído e toda a sorte de perturbação ensombram ambientes que haveriam de fornecer luz e paz ao coração.
Não sabemos estar calados nem quietos. Que bom seria prestar atenção a Roland Barthes: «Sentado, em paz, sem fazer mais nada, a Primavera vem».

Sucede que, para que a «Primavera do Espírito» sobrevenha, também precisamos de recorrer a um «personal trainer». Neste caso, a um «personal trainer» espiritual.
O «personal trainer» espiritual – que actua a partir do fundo de nós mesmos – é o Espírito Santo.

Fazer «exercícios espirituais» é, pois, ouvir e seguir o Espírito Santo. 
Não se trata tanto de rezar; trata-se de deixar que o Espírito Santo reze em nós com os Seus «gemidos inefáveis», inexprimíveis em palavras (cf. Rom 8, 26).

Para tais «exercícios», não precisamos de levar quase nada, nem a língua. Do que precisamos é de reaprender a arte e sublime sabedoria do silêncio.
O silêncio não nos distancia da Palavra. Como notou Paul Evdokimov, «o silêncio está dentro da Palavra», tanto mais que «o silêncio é uma qualidade de Deus».

A maioria dos nossos encontros espirituais ainda recorre muito ao «uso de palavras explicativas» e pouco à «escuta da Palavra inspiradora».
Há muita «lição» e pouca «contemplação»; muita «conversa» e pouco «recolhimento».

Como tudo tem o seu tempo (cf. Ecl 3, 1-8), o tempo dos «exercícios espirituais» deveria adoptar o «modelo monacal».
Diz a experiência que as palavras sem silêncio afastam, ao passo que o silêncio dentro da Palavra agrega.

É que, de acordo com São Serafim, o silêncio também é (salutarmente) contagioso: «Encontra o silêncio e uma multidão de seres humanos encontrará a salvação junto de ti».
Em nós, muitos verão quem habita dentro de nós e quem está além de nós.

Deixemo-nos guiar, então, pelo «personal trainer» espiritual, que nos conduz para o mais necessário, para o mais importante.
Já Anaxágoras tinha percebido que tinha nascido «para contemplar». E só quando contemplarmos – assegura Santo Agostinho –, seremos capazes de amar: «Contemplemos, contemplemos e amaremos, amaremos». Chegou a hora!

João António Pinheiro Teixeira

João António Pinheiro Teixeira

30 janeiro 2024