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Viver em democracia

Quando nos interrogamos sobre a qualidade e fiabilidade da nossa democracia, a resposta que obtemos é o descrédito e a frustração; e, às portas de celebrarmos as suas bodas de oiro (50 anos de vida), o receio nos visita de que nem outros cinquenta anos possam ser suficientes para a sua reabilitação e objetivação. 

Mas, então, onde encontrar a razão primeira deste desencanto e proscrição? Obviamente nas desigualdades, na fome, na pobreza, na desproteção social, no mau funcionamento dos serviços-centrais que aumentam, bem como na insuficiência e ineficácia do Serviço Nacional de Saúde (SNS), da Educação Nacional e da Justiça; e, igualmente, na falta de ação e resiliência dos órgãos decisores, executores e defensores do Estado de Direito no exercício público dos seus deveres de vigilância e fiscalização. 

Ainda longe estamos de uma democracia de qualidade quando esta consente no seu seio a mentira, a demagogia, a corrupção, o oportunismo, as falsas promessas e a promoção pessoal; como, ainda, quando lida bem com as fugas ao fisco, a evasão de capitais, a lavagem de dinheiros, a delapidação do património nacional e o tratamento privilegiado dos estrangeiros em termos fiscais face aos contribuintes nacionais. 

E esta fraqueza e inversão dos valores democráticos faz com que os extremismos políticos, quer de esquerda, quer de direita, avancem a galope; e estes movimentos ditatoriais e opressores não nascem e crescem por gestão espontânea em democracias estruturalmente ativas e participativas, mas quando lhes é aberta a oportunidade de instalação e avanço por regimes, mesmo democráticos, que funcionam mal, seja por omissão, seja por demissão. 

Ora, aprendemos que a democracia contém em si os meios que combatem e impedem os avanços dos seus inimigos reais; basta pensarmos naquilo que a História nos ensina sobre as democracias antigas de Atenas e de Roma ou as mais modernas como as dos países nórdicos. 

E, assim, facilmente, através de uma simples e rápida análise, concluímos que em democracia há lugar para as maiorias como para as minorias, desde que se respeitem mutuamente, bem como as regras vigentes e os princípios definidos e não se agridam nem subestimem; e, sobretudo, se respeitem uns aos outros e se possam pôr de acordo em tudo aquilo que sirva e seja bom para o povo que sempre dizem apoiar, ouvir e respeitar desinteressadamente.

Deste jeito, para que a democracia vingue, se afirme e siga o seu rumo certo e justo tem de haver um permanente combate contra a injustiça social, a corrupção, a demagogia, a pobreza e as prepotências dos mais ricos contra os mais pobres que geram desproteção em todos os sectores da vida social; e, igualmente, não afrouxar na luta pela redução das desigualdades, na impossibilidade natural de lhes pôr fim, cumprindo fielmente os objetivos e princípios fundamentais em que a vida democrática assenta. 

Depois, o mais importante de tudo é saber que os defensores, os guardiões da democracia somos nós, ou seja o povo que se preocupa com a sua legitimidade, qualidade, fiabilidade e verdade e sempre deseja que ela se imponha; e que os oportunistas, os corruptos, os rapaces, os impostores e os trampolineiros que sempre existem não tenham lugar, nem espaço de manobra e formas de imposição das suas torpes ideias e valores. 

E, fundamentalmente, porque respeitá-los é legítimo e natural, desde que não intentem contra os defensores e lutadores pela democracia; ademais, devem coexistir no seu seio, atendendo às regras e ideias que a maioria processa e pelas quais se bate incansavelmente. 

É difícil? Sem dúvida que é muito difícil saber estar e conviver em democracia, quando se não é tolerante, compreensível e humanamente justo e cooperante naquilo que às maiorias e às minorias diz respeito; todavia, temos de saber ser tolerante e saber estar em comunidade, pois, mesmo não sendo um regime político perfeito, a democracia é o menos mau de todos os regimes que existem e, por isso, merece que a defendamos e por ela lutemos incansavelmente. 

Então, até de hoje a oito.

Dinis Salgado

Dinis Salgado

24 janeiro 2024