Não pretendo ser pessimista com o artigo que vou escrever, mas alguém comentava, à mesa de um café, rodeado por vários amigos, que o nosso país, apesar de já contar com um milénio de existência, continua a ser como um adolescente destemperado, que não sabe bem o que quer e desconhece também o modo mais conveniente de proceder..
Com isto referia-me à crise política que vivemos e, apesar de não ser um simpatizante do partido que mantinha o poder com maioria absoluta, ficara profundamente chocado com os motivos que levaram a toda a agitação nos meios de quem detém o poder.
Considerava que as piores razões imagináveis minaram a vida política do país. E lamentava, sinceramente, que razões éticas tivessem, ao fim e ao cabo, convencido quem mandava a demitir-se e a obrigar o país a enfrentar novas eleições antes do tempo que estava previsto.
Ao fim e ao cabo, “somos um país sem maturidade – considerava – que não sabe respeitar prazos previstos, porque há, ao que parece, quem se aproveite duma maioria para fazer o que não deve, que é não dar exemplo transparente de honestidade e de cumprimento do poder que alcançou com conduta exemplar”.
Um dos amigos presentes fez-lhe notar que nada foi provado até agora e que as suspeitas podem ser falsas. Concordou, mas acrescentou que quem manda deve ser tão claro e eficiente nos seus procedimentos, que nem sequer possa levantar a mínima centelha de dúvidas sobre o que anda a fazer e o modo como o faz. Por outro lado, observava, deve ter o cuidado de reunir-se de gente que não levante quaisquer suspeitas sobre a forma como exerce as suas funções. O que significa que tem de ter uma cautela super-rigorosa sobre a moralidade de quem escolhe para trabalhar consigo.
E observou: “Não exijo nada de especial. Mas apenas que sejam honestos e honrados.”
Um outro parceiro da mesa perguntou-lhe: “Mas duvidas da honestidade, por exemplo, do primeiro-ministro que se demitiu?” Não hesitou em dizer que não. “No entanto, acrescentou, as pessoas que convida para trabalharem consigo têm de ser intocáveis. De contrário, de duas uma, ou é um ingénuo que não conhece bem quem escolhe, ou, na pior das hipóteses, pensa que a sua autoridade é suficiente para a contenção de quem pode não ser tão transparente como deve na sua forma de agir”. E ainda observou: “Ao fim e ao cabo, estamos ou não numa crise política? E não tinha a maioria absoluta? E qual é o seu fim: para governar como deve ser governado o país, ou para meter o país em crises que não servem senão par acentuar o atraso económico que nos domina, ao ponto de estarmos a ser superados por países que, durante várias décadas, estiveram submetidos ao regime comunista soviético, que os fez empobrecer e estagnar em vez de melhorar o seu nível de vida?”
Houve um silêncio bastante prolongado. E foi aproveitado por quase todos para tomarem o seu café, que esfriava nas chícaras com intensidade. Alguém comentou, com humor: “A crise política está-me a obrigar a tomar o café quase frio...” Todos riram com esta afirmação. E, acenando com a cabeça, concordavam que também o seu apetitoso líquido negro se tinha arrefecido...
“Portugal, repito, é como um adolescente vulnerável, que não sabe o que quer... Tudo lhe faz confusão. Parece que não sabe respeitar as oportunidades que lhe dão estabilidade. Não aguenta um governo o prazo que lhe concedeu a maioria absoluta... Ou seja, como bom adolescente, prima pela inconstância...”
“Mas, pelo menos – interveio alguém que tinha estado calado até então – vai procurar melhorar a situação com as novas eleições”. “Certo – atalhou o céptico que qualificou o nosso país como um rapazote atabalhoado que não sabe o que quer –, mas as eleições resolverão a situação, ou complicarão o estado das coisas com resultados dispersos e fragmentados?”
“Bem”, interveio alguém que não se tinha evidenciado até então. “Todos estaremos de acordo que, antes do 25 de Abril, não teríamos coragem para dizer o que dizemos à mesa deste café. Eu, pelo menos, recearia que houvesse por aqui algum “Pide” matreiro, que nos estivesse a vigiar. E isto é um facto que me regozija, apesar da crise política...” Todos concordaram, incluindo o que denegrira com veemência a situação actual do país.
“Tudo bem. Mas já basta de crises políticas... Para que servem as maiorias absolutas..?.” Insistia.