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O estranho caso Galamba

Independentemente do que se fosse passar na reunião de 14 de novembro entre o Primeiro Ministro demissionário e o Presidente da República acerca do então ministro Galamba (e fica-se a sensação de que a exoneração não seria assim tão evidente pois não seria necessária a audiência prévia) o lodaçal em que Galamba enredou o governo e aqueloutro atingiu foros nunca vistos. Galamba há muito que não devia estar na posição de Ministro ou, sequer alguma vez, deveria ter chegado a governante. Há muito que assim ditava a sua inépcia, no mínimo. Houve uma qualquer raiz, de tal maneira vigorosa, que o agarrou umbilicalmente ao lugar e ao Primeiro Ministro que resistiu em a cortar. Bastava a este que tivesse tido o mesmo critério que conduziu à sua demissão para ter afastado Galamba num ápice. Mas este subsistiu e subsistiu quase como as famosas pilhas que duravam e duravam, qual lapa agarrada à rocha do cargo, sem qualquer auto juízo crítico, sem nenhuma dimensão de consciência ética, sem algum juízo de responsabilidade política ou de censurabilidade pessoal. Alguém com o passado político recente que se conhece, é constituído arguido em processo crime, no e pelo exercício das suas funções, quando lhe são imputadas alegadas violações do código de conduta do governo, de ter deixado influenciar o conteúdo normativo de actos do governo e apresentados a Conselho de Ministros pelo próprio com disposições favoráveis a interesses concretos de privados, tudo numa teia de crimes indiciados como tráfico de influência, corrupção quanto a titulares de cargo político ou prevaricação. Qual é o poder que tem ou tinha? O que nos escapou? Foi mero capricho de Costa antes e mesmo nesta situação já intolerável de casos sucessivos? Porque não foi exonerado num estalar de dedos como seria normal? Mais não fosse, há outro juízo de censura ética que tenho por inultrapassável. Bem podem dizer que é algo da vida pessoal, mas tem repercussões públicas a partir do momento em que – bem ou mal pouco importa agora – foi dado a conhecer. Foram apreendidos estupefacientes (vulgo droga) na casa do então ministro, agora deputado, e não é facto desmentido. E das duas uma: ou afirmava não lhe pertencer, ou conformou-se com a presunção pública que pertence. E porque teria de o fazer? Porque de contrário, faz pairar um natural juízo de censura sobre o mesmo, seja ética, seja social. E não, o consumo de droga – ao invés do que muitos propalaram, alguns com responsabilidades informativas ou de verdade, públicas e publicadas – não é lícito ou legal. Uma coisa é o plano criminal, outra bem diferente é o plano da legalidade. Bem sei que o comum do cidadão os possa confundir, mas não pode alimentar-se esta ideia. O consumo de estupefacientes não é crime, mas a sua aquisição e detenção, mesmo que para o consumo, tem natureza ilícita sendo punível em sede de contraordenação. Quer dizer, apesar de não ter dignidade penal é tido como conduta socialmente não tolerada e censurável. É neste campo ético, social e de censura que me coloco e donde aquele facto não pode passar. Eu não quero – admito que haja quem queira ou não se importe – que um governante do meu país ou seu representante se drogue – não vou usar eufemismos – pouco, muito, haxixe, cocaína ou o que seja. A dignidade de um cargo ministerial ou outro de natureza político-representativa, o interesse e responsabilidade das funções não é, na minha opinião, compatível com tal comportamento. E nem se diga que pode fazer o que bem entender no seio da sua casa quando, para além de conduta ilícita, tal podia ter – mesmo que apenas potencialmente – reflexos no desempenho governativo ou de outro cargo de responsabilidade. Não pode haver dúvidas dos cidadãos que uma tal circunstância possa vir a afectar o desempenho público ou coloquem em crise a necessária confiança e idoneidade que se deposita naquele. É imperioso uma censura política e social, um escrutínio público. Lamento, mas não aceito uma ligeireza de apreciação da postura de um Ministro da República. Estranho mesmo que mais depressa se censurou a saída dele à rua em calças de pijama para passeio do cão. Os valores parecem que andam de pernas para o ar ou, então, já só vestem pijama ou se quedam mesmo nus!

António Lima Martins

António Lima Martins

7 dezembro 2023