As últimas sondagens para as legislativas de Março de 2024 revelam, para além da percentagem de eleitores que já têm o voto definido em cada um dos partidos, que o maior partido da oposição da actualidade não descola do partido do poder, apesar das trapalhadas em que este se meteu e de ser o responsável pela antecipação do acto eleitoral. É verdade que as máquinas partidárias ainda só agora começaram a montar as tendas e o circo, mas isso não explica tudo. Nem mesmo o facto do partido actual no poder estar em processo de escolha do novo líder estará a condicionar os eleitores de se expressarem. Qualquer que seja o vencedor desse processo, sabe-se que os dois principais candidatos estiveram e estão alinhados com o Governo ainda em funções e não se importam nada com isso. Aquele mesmo estudo revela ainda que é muito provável que a direita do espectro político nacional tenha possibilidades de governar finalmente, embora não se saiba em que condições. Montenegro tem pautado as suas intervenções recentes a reclamar o voto útil no seu partido, manifestando estar disponível para se coligar com parte da direita, incluindo com partidos que actualmente não têm sequer expressão do eleitorado para terem um deputado no Parlamento, mas desprezando o partido mais à sua direita. O facto é que a tendência de crescimento do Chega tem sido confirmada pelos diferentes estudos que apontam para um score à volta dos 16% nas intenções de voto, o que dificultará, a confirmar-se, que os sociais democratas se afastem dos seus principais opositores. O Chega vai ser o partido decisivo para a estabilidade governativa se os eleitores derem uma maioria à direita e o Partido Social Democrata for o vencedor. E neste enquadramento, há quem afirme que o Chega será responsável pela ingovernabilidade do país se não viabilizar um Governo de direita. Acontece que o povo não é estúpido ao ponto de dar 16% dos votos a um partido para que ele seja posto à margem de uma solução de governo. Responsável pela instabilidade do país? Isso é treta. É verdade que todos os partidos devem ser responsáveis, a bem do país e da democracia, mas será muito mais responsável pela eventual ingovernabilidade quem ganhar as eleições e for chamado a formar o futuro Executivo. O partido que ganhar, se não tiver maioria absoluta – e desta vez acho que não haverá, muito menos à direita, apesar da tentativa em puxar pelo voto útil –, é que tem que procurar uma solução de estabilidade governativa, não qualquer outro partido. Quem tem medo compra um cão, já diz o ditado popular. E se Montenegro tem medo que o seu partido seja associado ao de Ventura deve fazer isso mesmo. Mais, e deve anunciar com toda a clareza se vai ou não manter a sua posição ainda antes do acto eleitoral para que o povo vote com toda a informação. Não vá acontecer que os resultados o obriguem a dar o dito pelo não dito e os eleitores ficarem com mais uma evidência de que os políticos são mentirosos e trambiqueiros. Sabemos de antemão que se o Partido Socialista ganhar as eleições de novo vai pedir a mão a algum, a vários ou a todos os partidos à sua esquerda. Nesta matéria, independentemente de quem for o candidato socialista a primeiro-ministro, sabe-se que o partido não fará acepção de ideologia, desde que seja de esquerda, embora haja uns mais queridos do que outros. Ao contrário, o que se sabe, pelo menos para já, é que o Partido Social Democrata não quer, de forma nenhuma, algum tipo de acordo com o partido mais à sua direita. É um direito que lhe assiste no caso de ganhar o acto eleitoral, mas será também uma responsabilidade futura se precisar de todos os partidos à sua direita e não tiver moral para pedir um jeitinho a algum de quem tenha dito cobras e lagartos. Eu acho que deveria pensar melhor antes que seja tarde e a realidade se tornar escassa para governar, que é isso que penso vir a acontecer se Montenegro se mantiver intransigente a mudar de estratégia eleitoral.
Quem tem medo compra um cão
Luís Martins
5 dezembro 2023