Dir-se-ia que o Papa Francisco quer pôr termo a uma prolongada – e muito danosa – «invernia da Teologia».
O pensamento sobre Deus, apesar de numerosos esforços, tornou-se ultimamente muito repetitivo, demasiado explicativo e professoral, pouco cativante e escassamente inspirador.
Quase não sai das paredes das faculdades e dos manuais da especialidade. Às vezes, a Teologia parece endogâmica: multiplicam-se conceitos para discutir outros conceitos.
A robustez intelectual é indiscutível. A Teologia tem muito intelecto, mas falta-lhe coração. E, como bem explicou Xavier Zubiri, a inteligência só cumpre a sua função se também «sentir».
Pensar não é apenas conceptualizar. Para o teofilósofo espanhol, «pensar é acima de tudo comover-se».
Assim sendo, a Teologia não pode ser exercida somente «ex conceptu»; ela tem de brotar, antes de mais, «ex vita»: da vida de Deus e da vida das pessoas.
É por isso que, como alerta o Papa Francisco, também carecemos de uma «Teologia em saída». Carecemos de uma Teologia que saia do gabinete, que se ajoelhe e que se faça ao caminho.
Em suma, precisamos de uma Teologia com «sabor a Deus» e com «cheiro a ovelha». Será uma Teologia de estudo e de escuta: feita a partir do sacrário e da rua.
Ainda recentemente, o Santo Padre propôs, com tintas de urgência, uma «mudança de paradigma» na Teologia.
A proposta surgiu no documento «Ad theologiam promovendam» («Para promover a Teologia»), que reformula os estatutos da Pontifícia Academia de Teologia.
O critério é a encarnação de Jesus Cristo no tempo e no espaço.
A esta luz, «o Evangelho tem de ser projectado nas condições em que as pessoas vivem diariamente, em diferentes ambientes geográficos, sociais e culturais».
Não é possível que a Teologia se limite a «repetir abstractamente fórmulas e esquemas», como se resignasse a ser uma «Teologia administrativa».
Ao invés, os estudos teológicos têm de estar abertos ao mundo, não por uma «atitude táctica», mas na convicção de que chegou a hora de rever os seus métodos.
Na óptica do Papa Francisco, também a Teologia há-de ser «anabática», isto é, tem de ser feita de «baixo para cima».
Deverá começar por ser uma «Teologia soterrada», que vai ao encontro de Deus nos desvalidos da história e nos deserdados da vida.
O Santo Padre defende mesmo uma «Teologia extro-vertida», ou seja, «voltada para fora». Ela tem de marcar a diferença no mundo, não aceitando ser indiferente a quem vive no mundo.
De facto, há «imagens de Deus que, muitas vezes, não correspondem ao rosto cristão de Deus, que tem a configuração do amor».
Daí que à Teologia não baste cultuar o «amor da ciência». Ela tem de ser perita na «ciência do amor». É como se ela tivesse de baloiçar entre Tomás de Aquino e Teresa de Lisieux.
Afinal, estamos carentes de uma Teologia que faça «arder o coração» despedaçado de tantas vidas (cf. Lc 24, 32)!