Não faço ideia, nem tenho razões para o supor, em quem um leitor deste meu artigo votou nas últimas eleições legislativas. Os portugueses deram a um partido político, concretamente ao Partido Socialista, a maioria parlamentar absoluta.
Com certeza que esta opção dos nossos eleitores foi tomada em consciência, com o intuito de dar estabilidade política ao governo português, a fim de que ele pudesse decidir e orientar o nosso país para uma estabilidade e uma situação de paz e concórdia, no sentido de conseguir melhorar o nível de vida dos nossos cidadãos, nomeadamente daqueles que vivem em escalas mais precárias e de desconforto.
Um ano depois, todos nós fomos surpreendidos com o que aconteceu. E assistimos, com desgosto ainda que com admiração pela forma como o fez, para a decisão de se demitir do primeiro ministro, por haver a desconfiança de que no seu governo havia dúvidas quanto ao comportamento ético de vários dos seus membros e de colaboradores próximos, alguns dos quais foram detidos para interrogatórios.
Este banho de água fria que todos suportámos, fôssemos ou não eleitores fiéis à maioria absoluta, fez entrar, de novo, o nosso país, numa crise de estabilidade e de tempos complexos e hesitantes, pois só em Março próximo, de acordo com a decisão do Presidente da República, voltará à normalidade o poder de gerir Portugal, de acordo com o que os eleitores decidirem nas eleições marcadas par o dia 10 desse mês.
Não duvidamos que o governo de transição fará o que puder, embora limitado pelas restrições que a lei consagra para estas eventualidades. E vamos de novo assistir à motivação das diversas forças políticas, que apresentarão as suas promessas da maneira mais cativante, a fim de conquistarem os desejados votos dos seus eleitores.
E o que vai suceder de facto? Quais os resultados das votações? Decerto que os comentadores políticos dos meios de comunicação social encontram aqui um motivo de exploração atraente. Mas não são eles que resolvem o problema. Poderão, com os seus pareceres, induzir os cidadãos a dar o seu favor a determinadas forças políticas, mas só o que a contagem efectiva dos votos deixados por todos os portugueses determinará como será quem dirija o país e o modo como o poderá fazer. Efectivamente, é diferente uma maioria absoluta, como tinha o PS, ou um arranjo entre os diversos partidos para formarem um governo de coligação.
Ou seja, o nosso país parece que não é capaz de viver com tranquilidade. É certo que os dois maiores partidos já tiveram a possibilidade de governar Portugal com maioria absoluta. Mas não foram capazes de a manter. Num caso, porque perderam votos nas eleições a que concorreram, por opção livre dos eleitores. Mas neste último, pelas razões lamentáveis de que todos tomámos conhecimento.
Apesar de tudo, temos de nos render à atitude nobre e honesta tomada pelo Primeiro Ministro. Poderão alguns objectar: Não teria outra hipótese? Não fugiu às suas responsabilidades? Não é mais fácil apresentar a demissão e assim manter um governo limitado nas suas funções e, enquanto tal, não assumir a responsabilidade de ter de apresentar ao país verdadeiras soluções para a resolução dos seus problemas?
A vida e o exercício da actividade política só podem ter um caminho: a honestidade e a probidade. Quando um outro órgão de soberania, cujas funções são de zelar pelo procedimento ético das pessoas e das instituições e de reprimir qualquer desvio que possa ser criminoso, apresenta ao país – e, em particular, a membros do governo e a seus colaboradores próximos - suspeitas que podem denegrir o comportamento ético dos seus membros, a atitude compreensível do Primeiro Ministro, seu principal elemento, só pode ser uma: demitir-se e pôr-se à completa disposição da Justiça para que efective as suas averiguações de forma eficiente e límpida.
E foi o que fez o Dr. António Costa. Por isso, além de compreendermos a sua decisão, parece-nos que ela surge como a mais conforme em vista da situação do seu governo e da sua pessoa. Provocou uma crise nas possibilidades de acção de dirigir o país? É certo. Mas põe-se à perfeita disposição para que as investigações não sofram qualquer limitação. E isto é o que é correcto.