Nos últimos dias, António Costa perdeu as estribeiras e o bom senso. Sem melhor rasgo, atacou o Presidente injusta e irresponsavelmente, quando o único responsável pela crise que atingiu o pais é ele próprio. Foi ele que pediu demissão, foi ele que verificou que não tinha condições para continuar. O Presidente aceitou o seu pedido, e bem. Não ia ficar com a responsabilidade por um Governo em deriva que não era seu e não seria justo que deixasse o país e o seu povo ficar com as consequências de uma decisão que seria errada. Além disso, o pântano que já vinha a formar-se depressa adquiriria uma dimensão tal que ficariam em causa as Instituições democráticas e a própria democracia. Fez bem o Presidente em aceitar o pedido do Chefe do Governo. Será que passou pela cabeça de Costa que Marcelo ia ficar nas suas mãos? E quanto à dissolução do Parlamento, Costa sabia bem, como sabia o Partido Socialista e como sabia o País, o que ia acontecer se viesse a existir um pedido demissão do cargo de primeiro-ministro. Não colhe a crítica ao Presidente de que a dissolução “foi despropositada e desnecessária” porque todos estavam avisados desde que o Executivo tomou posse, ou quem agora critica achava que o mais Alto Magistrado da Nação é um cravelho de pau? Não colhe o desagrado do ainda primeiro-ministro. Foi o próprio que se encurralou. Devia ter pensado melhor antes. É uma cobardia António Costa não assumir a responsabilidade que é só sua e não de terceiros. Foi ele que fez a interpretação do último parágrafo do documento da Procuradoria Geral da República, foi ele que quis demitir-se, é dele a exclusiva responsabilidade de ter ficado queimado e lhe ser difícil aquele almejado alto cargo europeu. Pode não ser culpado no processo que corre na Justiça, e acredito que assim acontecerá, mas é responsável pelas decisões que só a si diziam e dizem respeito.
Entretanto, instalou-se a ideia de promiscuidade, que não é de agora, entre a política e a economia. O filme já passou antes quando um outro primeiro-ministro socialista se viu confrontado com a Justiça e dessa vez muito seriamente. A culpa não é seguramente nem do Presidente nem da Justiça. Não há cabala, não há golpe. Isso é imaginação e marketing político em acção para desorientar e condicionar os mais desatentos. “À política o que é da política, à justiça o que é da justiça”, uma frase que todos já ouvimos alguém dizer. Então, há que ser coerente e consequente. O próprio e os correligionários. E não devem valer sequer indirectas. O ditado popular, afinal, pode ser dito de outra forma: “refresco no pacote do outro é pimenta no meu”.
Em Março teremos eleições. Não há favas contadas. Ninguém tem razões para qualquer tipo de deslumbramento. Nem o PSD pelo facto de ter sido o PS o responsável pela crise política. Nem o PS pelas últimas sondagens mostrarem que o povo não está assim tão insatisfeito. Numa coisa Costa pode vir a mostrar que tem razão: os resultados eleitorais podem vir a não permitir uma maioria estável. Desta vez, estou em crer, não haverá nenhuma maioria absoluta e bem. Não são favoráveis as condições para que exista de novo “uma espécie de ditadura branqueada”. Mas a direita pode muito bem vir a ter uma maioria de deputados na Assembleia da República. E é aí que Costa quis chegar quando admitiu a possibilidade de haver nova dissolução do Parlamento, com o intuito de colar o Chega e a Iniciativa Liberal ao PSD. Tenho para mim que dificilmente o segundo e o terceiro conseguirão ter deputados suficientes para formar uma maioria parlamentar, sendo que ambos já afirmaram que não querem o Chega por perto. Pode-lhes sair o tiro pela culatra. O Chega, que se mostrou disponível até agora, pode fazer-lhes um manguito se vierem a precisar dos seus votos. Mas, mesmo que o não faça, será uma fraude eleitoral garantir-se agora que em situação nenhuma haverá uma coligação com o Chega e depois isso acontecer. A esquerda já assumiu que pode unir-se. A direita não o faz porquê? O Chega aparece em alta nas sondagens e é o PSD que anda deslumbrado com as mínguas intenções de votos?