No próximo mês de junho, a Comissão Europeia irá anunciar um pacote de defesa da Democracia centrado na resiliência do espaço democrático da UE. Apesar das dúvidas em torno das restrições que as medidas possam causar à intervenção cívica na UE e fora dela, o reforço dos instrumentos híbridos já existentes, a SIAC – Capacidade de análise de inteligência única, o RAS – Sistema de alerta rápido e a existência de equipas híbridas de resposta rápida política de ciberdefesa da UE, são uma realidade já de si reforçada pelo comité especial sobre interferência estrangeira em todos os processos democráticos da UE, criado pelo Parlamento Europeu há três anos. O trabalho permitiu mapear as ameaças de interferência estrangeira em todas as suas formas, incluindo desinformação, manipulação de medias, plataformas e sistemas de publicidade, ataques cibernéticos, ameaças e assédio a jornalistas, financiamentos políticos, captura e cooptação de elites. Houve consenso para a adoção de sanções específicas contra a interferência estrangeira e campanhas de desinformação. Apesar das boas intenções, o impacto das medidas tarda e ainda que se espere da Comissão uma ação política de força, corremos o risco de nas próximas eleições europeias, estarmos confrontados com ataques mais consistentes, utilizando a arma mais poderosa e recente da Inteligência Artificial. O Parlamento Europeu quer, por isso, acelerar as medidas e o ano transato (março), criou um novo comité especial sobre interferência estrangeira com o objetivo de identificar as bases legais de resposta, preparando o terreno para soluções institucionais permanentes da União Europeia. O caso mais recente, envolvendo a vice-presidente do PE, transformaram estas medidas numa urgência europeia e reforçaram a vontade daquele comité especial de intervir em todos os processos, desde logo no combate à desinformação, no reforço da integridade, transparência e responsabilização no Parlamento Europeu. Com o relatório aprovado em abril passado, estão criadas as condições, espera-se, para que as recomendações e atualizações sobre a estratégia coordenada da UE levem a Comissão a desenvolver um pacote eficaz de defesa da Democracia, tendo em conta as propostas saídas da Conferência sobre o Futuro da Europa. Contudo, entre o estado de otimista gerado por estes anúncios e o pessimismo que a realidade impõe, é de esperar que os governos nacionais façam mais, começando, por exemplo, pela punição criminal exemplar para os(as) autores(as) de desinformação ou tentativas de interferência em atos eleitorais. Portugal pode ser um exemplo neste combate e não lhe faltam motivos para avançar proactivamente nesta batalha pela Democracia. Ainda não assistimos a julgamentos céleres e exemplares neste combate, apesar de termos legislação suficiente para o fazer, o que demonstra falta de sensibilidade para a urgência da intervenção. O que vai ser adotado pela Comissão é uma incógnita, ainda que não haja motivos para deixar de acreditar que algo será feito. Seria bom que fossem complementadas com medidas nacionais dada a especificidade de cada país, mas temo que possamos claudicar se todas as intenções forem mascaradas num pacote de medidas à la carte para europeu ver, mas sem a força que se exige para eliminação dos ataques permanentes a que temos estado sujeitos. Nesta guerra, é difícil fazer prognósticos sobre a dimensão da vitória que a Europa irá conseguir; sei é que as correntes extremistas, os negacionistas e os detentores da verdade alternativa, que nos massacram diariamente, continuam a fazer a sua estrada, sem que nada os detenha. É pouco, muito pouco para dar resposta a tanta violação de princípios básicos de não interferência estrangeira e consequentemente da manipulação dos cidadãos. Cabe-nos a nós mais uma vez, arregaçar as mangas e ir à luta. E esta deve começar por onde nunca deveria ter sido interrompida; na educação e, por esta via, na consciencialização política de cada uma e de cada um. Se nos focarmos na dimensão do problema e nas medidas concretas que estão ao nosso alcance como o reforço da transparência da governação e a participação ativa na vigilância e denúncia de ataques à integridade das instituições, talvez faça sentido confiar na capacidade da europa para se reinventar e responder antecipadamente aos que tem desafiado a Democracia para um combate que tem tudo para acabar mal.