twitter

Cavaco Silva e Marcelo – a lucidez e a incoerência

Se é possível determinar um dos destinatários políticos da lúcida e magistral intervenção do Professor Cavaco Silva no passado sábado é, sem dúvida alguma, o atual Presidente da República.

De facto, o presente estado do país, ultrapassado por países que no inicio do século estavam muito mais atrasados do que Portugal e o empobrecimentos das pessoas, é também da responsabilidade do Presidente da República.

O antigo comentador televisivo que chegou a Presidente devido apenas devido à presença contínua e com sucesso nos meios de comunicação social mas, ao contrário dos seus antecessores, sem percurso político de realce, desatou a ter uma intervenção pública exagerada imprópria para um presidente, talvez com saudade dos outros tempos, cuja palavra deve ser pensada, ponderada, usada em momentos importantes para o país e não a toda a hora, sobre qualquer assunto e em qualquer circunstância.

A ligação aos portugueses é importante mas não é necessário tratar o nosso povo como se precisasse de cuidados psicológicos, a precisar de apoio ou suporte mental. Até em tudo em que envolveu, desde os sem abrigo às vitimas flageladas pelos fogos florestais, à exigência do apuramento cabal dos casos de corrupção e em muitas outras ocasiões, o professor Marcelo Rebelo de Sousa, deixa ficar tudo pelo imediatismo de momento do qual tira sempre resultados pessoais; isto, até ao dia em que o povo comece a perceber e comece a exigir resultados das suas ações.

Verdadeiramente incrível foi a declaração – que proferiu após o fim da legislatura que manteve o governo da geringonça – de que iria sentir saudades daquele parlamento e, com esses e outros comportamentos de ligação umbilical a governos incompetentes, cavou o próprio buraco em se enfiou.

Durante todos estes anos, o mais alto magistrado da Nação suportou, sem dever suportar, um governo que nada fez de relevante para Portugal e para os portugueses, imiscuiu-se na luta partidária normal em democracia, escolhendo o lado dos governos de António Costa e com isso comprometeu-se também com os efeitos que as suas políticas ou a ausência delas trouxeram para Portugal.

Até chegou ao cúmulo, demonstrando o uso inadequado da sua magistratura, de poder dar palpites quanto ao facto do maior partido da oposição estar ou não preparado para governar, quando isso não é da sua conta mas sim da opinião e escolha dos portugueses.

Agora o Professor Marcelo Rebelo de Sousa, confrontado com o estado do país, percebeu no fosso em que se meteu mas, se conseguir sair dele – algo que está por verificar – nunca será sem muito suor, esforço e feridas.

Os danos para o crédito político do atual Presidente da República são enormes, sendo ele o único responsável por isso.

As grandes diferenças entre o anterior Presidente da República e o atual começaram logo pela ausência de percurso político relevante deste comparado com o seu antecessor, mas também quando comparado com Mário Soares e Ramalho Eanes.

Outra diferença é que o Professor Cavaco Silva exerceu o seu mandato em condições muito difíceis, no início com um Primeiro Ministro amoral, para não usar outra palavra mas, até certa altura com muito apoio popular que afastou logo que teve oportunidade com a sua forte intervenção presidencial, quer em seguida no combate à bancarrota socialista, quer por fim, dado posse, sem nenhuma vontade, a um governo com partidos derrotados nas eleições e apoiado por partidos defensores de ideologias não democráticas.

No entanto, a principal diferença entre o Professor Cavaco Silva e o Professor Marcelo Rebelo de Sousa é que nunca cedeu a populismos para benefício pessoais, mas pautou as suas ações sempre a favor do interesse nacional e sempre igual a si próprio. Os portugueses, do Professor Cavaco Silva, sabem bem o que contar, e, embora sendo Presidente de todos os portugueses, nunca virou as costas a quem o elegeu, sendo de uma coerência intocável, o que originou, somado ao sucesso da sua anterior governação, uma respeitabilidade e influência que nenhum político português conseguiu, incluindo Mário Soares que facilmente derrotou nas urnas.

Nunca as posições políticas de Marcelo Rebelo de Sousa, após o fim do seu mandato, terão um nível tão elevado em termos de repercussão, impacto e influência como as que Cavaco Silva têm.

Aliás, Marcelo Rebelo de Sousa face ao atual estado de empobrecimento de Portugal, face à falta de perspetivas dos portugueses, face ao atual cansaço e incompetência governativa, nada mais terá a fazer para, no momento próprio, colocar em prática todo o conteúdo da oportuníssima intervenção de Cavaco Silva, se ainda quiser salvar algo de positivo do seu medíocre mandato.

Joaquim Barbosa

Joaquim Barbosa

24 maio 2023