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“Louvem o seu nome com danças”

 

Instituído em 1982 pelo Comité Internacional de Dança da UNESCO, 29 de abril é o Dia Mundial da Dança, visto ter sido nesse dia do ano 1727 que nasceu o bailarino francês Jean-Georges Noverre (1727). Como o Festival Internacional de Órgão de Braga, já em curso, optou, neste ano, por esta temática, está justificada a escolha. 

Por diversas vezes, a Sagrada Escritura refere a dança e até a incita ou sugere. Aparece quase sempre relacionada com instrumentos musicais e assume alguma diversidade. É, no geral, sinal de adoração e louvor, de alegria e regozijo, de celebração e gratidão a Deus. A dança bíblica tem quase sempre uma coloração cultual e processional, mas, por vezes, celebra feitos militares: “Ao regressar o exército, depois de David ter morto o filisteu, de todas as cidades de Israel as mulheres saíram ao encontro de Saul, cantando e dançando alegremente, ao som de tambores e címbalos. E, à medida que dançavam, cantavam em coro: ‘Saul matou mil, mas David matou dez mil’” (1 Sm 18, 6-7; cfr. 29, 5). 

O livro do Êxodo refere que, após a passagem do Mar Vermelho, “Maria, a profetisa (...), tomou nas mãos uma pandeireta e todas as mulheres saíram atrás dela com pandeiretas, a dançar” (15, 20). A dança contagia quem está por perto e tem como finalidade exprimir a gratidão a Deus pelos feitos em favor do seu povo.

Na trasladação da Arca da Aliança para Jerusalém, “David e toda a casa de Israel dançavam diante do Senhor, ao som de toda a espécie de instrumentos: harpas, cítaras, tamborins, sistros e címbalos” (2 Sm 6, 5). O texto acrescenta que “David, cingindo a insígnia votiva de linho, dançava com todas as suas forças, diante do Senhor.” (v. 14). Mical, filha de Saul, “olhou pela janela e viu o rei a saltar e a dançar diante do Senhor; e sentiu por ele desprezo em seu coração” (v. 16). Ousou até criticá-lo: “Que bela figura fez hoje o rei de Israel, dando-se em espetáculo às servas dos seus vassalos, e descobrindo-se sem pudor, como qualquer homem do povo!” (v. 20). David respondeu-lhe, legitimando a sua atitude: “Foi diante do Senhor que dancei, do Senhor que me escolheu e me preferiu a teu pai e a toda a tua família, para me fazer chefe do seu povo de Israel” (v. 21).

O livro dos Salmos tem dois momentos em que não só refere a dança, como a incita: “Louvem o seu nome com danças” (Sl 149, 3); “Louvai-o com tambores e danças” (Sl 150, 4). Ainda na literatura sapiencial, o Eclesiastes (Qohélet), ao afirmar que há um tempo para tudo, acrescenta: “tempo para se lamentar e tempo para dançar” (3, 4).

Entre os profetas, é Jeremias quem escreve: “Hei-de reconstruir-te e serás restaurada, ó donzela de Israel! Ainda te hás-de adornar dos teus tamborins e participar em alegres danças” (31, 4); “Então, a jovem alegrar-se-á, bailando; jovens e velhos partilharão do seu júbilo...” (31, 13). E o livro das Lamentações deixa escapar um desabafo: “Fugiu-nos a alegria dos corações, nossas danças converteram-se em luto” (5, 15).   

A primeira referência do Novo Testamento à dança aparece na execução de João Batista (Mc 6, 22: “Tendo entrado e dançado, a filha de Herodíade agradou a Herodes e aos convidados”). Se aqui se refere o agrado, em Lc 7, 32 deparamo-nos com o desagrado das “crianças sentadas na praça, que se interpelam umas às outras, dizendo: ‘tocámos flauta para vós e não dançastes’”.

A mais sugestiva referência neotestamentária à dança apresenta-a, contudo, como sinal de alegria e festa: “o filho mais velho estava no campo. Quando regressou (...), ouviu a música e as danças” (Lc 15, 25). Se, por um lado, é sinal da misericórdia do pai em relação ao filho mais novo, por outro, a dança é expressão da alegria que se faz sentir no céu, quando um pecador se arrepende. 

É legítimo que se veja a dança como um carisma, mesmo se Paulo a não refere (cfr. Rm 12, 6-8; 1 Cor 12, 4-10). A única condição que se poderá colocar a quem dança é que proceda com elevação (1 Cor 14, 40: “Que tudo se faça com decoro e ordem”) e que a dança não seja motivo de escândalo, antes se oriente para o louvor e a glória de Deus (1 Cor 10, 31-32). A par da música, a dança é, na Sagrada Escritura, uma das formas mais sublimes de dar glória a Deus!  

 

 

 

P. João Alberto Correia

P. João Alberto Correia

1 maio 2023