Por aquilo que tenho visto, a entrada em vigor no início do ano passado de uma nova lei das garantias (NLG) tem passado praticamente despercebido ao comum dos cidadãos e dos agentes económicos.
Contudo, muitas regras mudaram e essas mudanças são importantes.
Começamos por relembrar que estamos a falar de uma lei que se aplica à compra e venda de bens de consumo novos, usados e recondicionados e com elementos digitais incorporados (por exemplo, um smartwatch), à compra e venda de bens imóveis e ao fornecimento de conteúdos e serviços digitais.
Não sendo possível referir neste espaço todas as alterações, referimos alguns dos aspetos mais relevantes das alterações.
Não nos podemos desde logo esquecer que esta legislação apenas se aplica a relações de consumo, ou seja a contratos de compra e venda celebrados entre consumidores e profissionais. Não abrange contrato de compra e venda entre particulares e também não se aplica à compra e venda exclusivamente comercial (entre comerciantes). Já no caso da compra e venda de bens que se destinem a ter um uso misto, desde que a finalidade comercial não seja predominante no contexto global do contrato, aplicam-se a s regras da nova legislação.
Um bem considera-se conforme (vulgo, sem defeito) quando cumpre os requisitos de conformidade, que podem ser subjetivos e objetivos e que são cumulativos. Os requisitos subjetivos referem-se àqueles aspetos que são especialmente acordados entre o comprador e o vendedor. Por exemplo, se eu encomendo a entrega de um carro branco, não existe conformidade se me pretendem entregar um carro amarelo. Já os objetivos, como o nome indica, prendem-se com aspetos que têm de ser cumpridos, independentemente dos requisitos subjetivos, ou seja um bem de consumo tem de ser apto ao uso a que aqueles bens se destinam (um relógio tem de dar as horas) e tem de corresponder à descrição e à quantidade e possuir as qualidades e outras características inclusive no que respeita à durabilidade, funcionalidade, compatibilidade e segurança dos bens do mesmo tipo. Já relativamente aos prazos de garantia estes foram alargados, no caso dos bens novos e bens recondicionados para 3 anos (no caso dos bens usados pode ser reduzido para 18 meses por acordo). No caso de bens com elementos digitais, o prazo também é de 3 anos (exceto em casos de fornecimento contínuo de duração superior; caso em que o prazo de garantia é maior). Também nos bens imóveis há alterações: 10 anos de garantia relativamente a defeitos com elementos construtivos estruturais e 5 anos para os restantes elementos. No caso de conteúdos ou serviços digitais (fornecimento de um jornal digital, serviço de streaming ou armazenamento em nuvem, por exemplo), o prazo é de 2 anos, exceto no caso de fornecimento contínuo, caso em que o prazo de garantia é igual ao período de duração do contrato.
Estes prazos contam-se a partir da entrega do bem ao consumidor.
Em caso de defeito, o consumidor tem direito à reposição da conformidade através da reparação ou substituição do bem e, eventualmente à redução do preço ou à resolução do contrato. Mas agora, o exercício destes direitos é feita segunda aquela ordem e não, como acontecia antes, ao livre arbítrio do consumidor.
Isto sem embargo da existência de um novo direito, dito de rejeição, nos casos em que a falta de conformidade se manifesta no prazo de 30 dias após a entrega do bem e que permite então ao consumidor solicitar a imediata substituição do bem ou a resolução do contrato.
Autor: Fernando Viana