Segundo o presidente da Equipa de Coordenação Nacional das Comissões Diocesanas e Castrense de Proteção de Menores e Adultos Vulneráveis, este número permite várias interpretações: “Ter havido 26 casos reais, ter havido mais, mas apenas só 26 [vítimas] terem participado, haver quem tenha comunicado [casos] à Comissão Independente e não tenha querido duplicar as queixas, alguma desconfiança em relação às comissões” da Igreja para lhes fazer chegar as denúncias.
Souto Moura, intervindo no I Encontro Nacional das Comissões Diocesanas e Castrense de Proteção de Menores e Adultos Vulneráveis, que hoje decorre em Fátima e que assinala o primeiro aniversário da criação da Equipa de Coordenação, assumiu que este é um tempo de “adotar uma postura de ausência de ambiguidades” e de grande responsabilidade por parte das estruturas da Igreja, tendo sempre presente as palavras do Papa Francisco sobre o abuso sexual no seio do clero: “Um só caso é uma monstruosidade” e deve haver “tolerância zero” em relação a estas situações.
A uma semana da Comissão Independente para o Estudo de Abusos Sexuais de Crianças na Igreja Católica Portuguesa, liderada pelo pedopsiquiatra Pedro Strecht, apresentar o relatório sobre a situação em Portugal, Souto Moura disse que, a partir de agora, “quem fica [no terreno, a ouvir as potenciais vítimas] são as comissões diocesanas”, as quais devem “ser um motor de confiança da Igreja e motivo de credibilidade” para os queixosos.
Na ocasião, o ex-procurador-geral da República deixou um desafio para reflexão, sobre se a questão dos abusos “é ocasiona ou sistémica”, ao qual o padre Pereira de Almeida, vice-reitor da Universidade Católica respondeu minutos depois: “Quase parece uma epidemia, mas não é da natureza da Igreja”.
Por sua vez, o presidente da Conferência Episcopal Portuguesa (CEP), José Ornelas, sublinhou que a situação de abusos sexuais na Igreja “é a contradição absoluta em relação ao que é professado na Igreja” e agradeceu aos membros das comissões diocesanas, face à “realidade penosa” com que têm de lidar e para a qual são necessárias “coragem e decisão”.
Quanto ao relatório que a Comissão Independente vai revelar no dia 13 de fevereiro, a análise que a Igreja vai fazer é no sentido de que haja “consequências operativas”.
No dia 10 de janeiro, a CEP assegurou estar preparada para “tomar medidas adequadas” que se imponham pelo relatório da Comissão Independente que estuda os casos de abusos na Igreja.
O relatório será apresentado no dia 13 de fevereiro, em Lisboa, e nesse mesmo dia a Conferência Episcopal emitirá um comunicado com a sua primeira reação. O documento ser-lhe-á entregue por Pedro Strecht no dia anterior.
Entretanto, para 03 de março, está já convocada uma Assembleia Plenária do episcopado católico português, para uma análise mais profunda do documento preparado pela Comissão Independente.
A Comissão Independente – que além de Pedro Strecht, integra o psiquiatra Daniel Sampaio, o antigo ministro da Justiça Álvaro Laborinho Lúcio, a socióloga Ana Nunes de Almeida, a assistente social e terapeuta familiar Filipa Tavares e a realizadora Catarina Vasconcelos – começou a receber testemunhos no dia 11 de janeiro de 2022.
Em 11 de outubro, anunciou que já validara 424 testemunhos, assumindo que a maior parte dos crimes reportados já prescrevera. Dezassete dos casos, contudo, haviam sido já comunicados ao Ministério Público.
Durante a primeira parte do encontro de hoje, interveio, também, Rute Agulhas, psicóloga e membro da Comissão de Proteção de Menores do Patriarcado de Lisboa, que alertou para o facto de a justiça nem sempre ser “amiga” das crianças ou adolescentes vítimas de abuso, pois estas “são ouvidas vezes sem conta” durante o processo, o que pode contribuir para uma “revitimização”.
Durante a tarde, e à porta fechada, as comissões diocesanas vão fazer um balanço da sua atividade no último ano e apontar as dificuldades sentidas na sua missão.
Autor: Agência Lusa