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Que fazer com o bónus de 125 euros?

Por decisão do governo – no passado dia cinco de setembro – cada português, que ganhe menos de 2.700 euros por mês, vai receber um bónus de 125 euros em outubro. Esta fórmula de ‘subsídio’ tenta compensar o agravamento da inflação, que tem fustigado o país e a Europa nos últimos meses.

Para usufruir deste benefício é preciso que o utente tenha no quadro de atribuições fiscais o número de IBAN, pois o mesmo será feito por transferência bancária…

1. Será isto um bónus ou um engodo em forma subsidiária? Os potenciais milhares de abrangidos estarão capazes de preencherem as condições exigidas? Esta espécie de ‘bodo aos pobres’ será honesta e sem tentáculos não detetáveis a olho nu? Não haveria outras modalidades (eficientes, simples e imediatas) de ajudar os mais ‘desfavorecidos’ sem tanto estrilho de comunicação? A fasquia a que colocaram a possibilidade de receber esta ‘ajuda’ quais foram os critérios objetivos para a sua implementação? Até que ponto estes 2700 euros de ordenado são auferidos por quantos portugueses? Terão feito o levantamento de quantos receberão tal ajuda? A arrecadação com as contas da inflação – não inscrita no orçamento de estado – não deveria ser orientada noutra direção do que andar a dar ‘esmolas’ à população?

2. Confesso, muito humildemente, que acho que o meu voto vale mais do que 125 euros – penso eu na minha presunção de não votante em quem tal decidiu – com que o governo tentou ‘comprar-me’. Efetivamente este bónus quase soa a suborno, senão a manipulação dos menos bem-pagos no seu trabalho.

Ter, de repente, mais 125 euros de stock na conta poderá criar engulhos a quem está habituado a gerir os parcos recursos de pouco mais setecentos euros por mês. Valerá a pena investir nalguma peça de roupa ou de calçado? Será mais útil poupar para algum presente de Natal? Que utilidade lhe dar?

3. A impressão que fica, geralmente, é que poucos usarão aquele montante de benefício para aferrolhar. Na lógica mais simplista: não custou a ganhar, também não custará a gastar. Efetivamente vivemos naquela atitude do ‘chapa ganha, chapa gasta’… sem dó nem critério. Aliás, a mentalidade subjacente à decisão governamental vai nessa linha de ajudar a ter mais uns trocos para fazer face às despesas inesperadas.

Enquanto não mudarmos de mentalidade andaremos a reboque de migalhas dadas sem custo nem mérito e, portanto, esbanjadas na mesma proporção…De facto, enquanto o subsídio for a melhor fonte de rendimento e não o trabalho, continuaremos a enganar-nos e a sermos candidamente enganados.

4. Recordo, mais uma vez, a alegoria bíblica da escolha das árvores de um rei:

«As árvores puseram-se a caminho para ungirem um rei para si próprias. Disseram, então, à oliveira: 'Reina sobre nós. «Disse-lhes a oliveira: 'Irei eu renunciar ao meu óleo, com que se honram os deuses e os homens, para me agitar por cima das árvores?' As árvores disseram, depois, à figueira: 'Vem tu, então, reinar sobre nós.' Disse-lhes a figueira: 'Irei eu renunciar à minha doçura e aos meus bons frutos, para me agitar sobre as árvores?' Disseram, então, as árvores à videira: 'Vem tu reinar sobre nós.' Disse-lhes a videira: 'Irei eu renunciar ao meu mosto, que alegra os deuses e os homens, para me agitar sobre as árvores?' Então, todas as árvores disseram ao espinheiro: 'Vem tu, reina tu sobre nós.' Disse o espinheiro às árvores: 'Se é de boa mente que me ungis rei sobre vós, vinde, abrigai-vos à minha sombra; mas, se não é assim, sairá do espinheiro um fogo que há-de devorar os cedros do Líbano!'» (Jz 9, 8-15).

Precisamos, urgentemente, de refletir sobre as nossas escolhas eleitorais e não só, pois lançados os dados, o processo como que se torna irreversível, tanto para o bem como para o mal…

Quem nos engana com pouco poderá não resistir à tentação de nos querer ludibriar com mais, fazendo do seu posto de comando uma forma de se eternizar com engodos, mentiras e, porque não, subsídios.

5. Por muito que nos tentem comprar, teremos um preço muito alto: o da dignidade, da liberdade e de não querermos ser escravos por razões de mera comida e/ou de regalias subtis à custa do essencial…


Autor: António Sílvio Couto
DM

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26 setembro 2022