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Os filhos do divórcio

Lembram-se da princesa Diana, a menina tímida e delicada, de olhos brilhantes e expressão doce que encantou o mundo? A sua presença frágil, doce, tímida e reservada, com um singular brilho no olhar, encantava as pessoas e ajudava a criar o imaginário da princesa delicada e encantada cujos amores não eram correspondidos: parecia andar à procura de um amor que nunca tivera… Sempre fiquei a pensar o que haveria por detrás daquela aparência de sorriso doce e esquivo que parecia andar à procura de algo que lhe faltava. Acariciava as crianças como se o carinho que lhes dava fosse algo que ela precisava também para si. Pois é, houve mesmo um grande trauma na sua infância. Quem o confidenciou foi o irmão, Charles Spencer, numa entrevista à Sunday Times Magazine: quando ela tinha 5 anos, a mãe deixou os filhos e foi viver com outro homem. O abandono da mãe e depois o divórcio formal dos pais provocaram nela um choque emocional tão forte que durante tempo se recusava a sair das escadas da porta, onde se sentou, a chorar, quando a mãe foi embora, à espera que ela voltasse. A mãe tinha-lhe prometido que voltaria para a ver, mas nunca mais voltou… E a ferida desta ausência deixou marcas.

1. Já se sabia que o trauma do divórcio é um factor de risco para a depressão e ansiedade que mais tarde se vão manifestar na idade adulta e que “os filhos do divórcio” têm sido associados a um maior risco de desenvolver transtornos de humor e instabilidade emocional e até mais ligados a experiências de drogas, como forma de compensação; o que não se sabia é que isso afectava e permanecia, como se de uma deficiência se tratasse, ao nível da carência hormonal da oxitocina na idade adulta. Segundo um estudo recente na Baylor University, os adultos cujos pais se divorciaram quando eles eram crianças apresentavam níveis mais baixos de oxitocina. A equipa reuniu 128 pessoas com idades compreendidas entre os 18 e 62 anos. Verificou-se que os níveis de oxitocina (hormona que é produzida pelo hipotálamo e tem, entre outras funções, a capacidade de desenvolver o apego e simpatia entre as pessoas, pelo que se chama, habitualmente, a “hormona do amor”) eram substancialmente mais baixos entre os adultos cujos pais se divorciaram quando eles eram crianças. Ora, este baixo nível de oxitocina está associado a dificuldade de criar e manter relações afectivas normais e estáveis.

2. Todo o mundo sabe que a separação ou divórcio dos pais contribui significativamente para mudanças no dia a dia dos filhos, que se sentem divididos entre a mãe e o pai, as pessoas mais importantes para eles. E que este acontecimento acaba por interferir no seu desenvolvimento. Muitas vezes, esta separação é sentida como sendo vítimas de sentimentos de abandono, o que é afectivamente muito doloroso e traumatizante. Para os adolescentes, o impacto desta separação é vivido com especial desgosto e angústia, pois embora já emocionalmente mais desenvolvidos, estão a passar por uma fase de especial insegurança e transição e culpam os pais por os terem traído. Perante a separação dos pais, a criança é obrigada a reorganizar-se internamente em torno deste acontecimento, muitas vezes como se um deles tivesse morrido, num processo de luto que dificulta a sua relação pessoal com os colegas e o equilíbrio afectivo no seu dia a dia, que se vai reflectir também na capacidade de concentração para estudar e aprender.

3. É difícil e doloroso falar do divórcio porque várias causas podem concorrer para isso e sobretudo porque é o desmoronar de um sonho de amor, onde os mais afectados são sempre os filhos; mas, a verdade é que, quando o relacionamento não melhora, talvez seja preferível separem-se do que viver em constante conflitualidade e amargura. Que podem, então, fazer os pais para minorar estes danos, quando a separação é mesmo inevitável? Ter consciência de que, apesar da separação, as crianças continuam a esperar que os pais continuem disponíveis para os acolher e ajudar; se isso não acontece, sentem-se abandonados e sofrem mais. E mais acentuadas são as consequências na sua vida futura. É por isso que, apesar de separados, devem permanecer unidos e presentes no bem-estar e educação dos filhos. Precisam de entender que a separação é apenas entre eles os dois e não entre eles e os filhos. E que, mesmo separados, diante dos filhos devem saber elogiar as qualidades do antigo cônjuge e manter a cordialidade entre si para ajudarem os filhos a manter uma imagem positiva dos pais e aprenderem a ser tolerantes. Mesmo que tenham deixado de ser marido e mulher, não deixam de ser pais e os filhos continuam a precisar de sentir que têm um pai e uma mãe, que nenhuma outra pessoa pode substituir.


Autor: M. Ribeiro Fernandes
DM

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11 outubro 2020