twitter

Apanhados 14

Muito longe vão os tempos em que, por falta das necessárias infraestruturas de água e de saneamento, as cidades eram autênticas cloacas a céu aberto; e, como tal, normalíssimo e comum era haver habitantes que faziam dos becos, ruelas e ruas locais apropriados para descarregarem, de manhã, as penicadas de matérias orgânicas, sólidas e líquidas, que, durante a noite, se resumiam aos alívios fisiológicos intestinais.

E longos e ínvios foram os caminhos a percorrer até que as cidades se apetrechassem das ferramentas indispensáveis para o fornecimento de água às habitações, antes da desconfortável responsabilidade de chafarizes e fontanários públicos, bem como para a implementação das redes de saneamento, sobretudo através da canalização e do tratamento de esgotos; e é através deste conjunto de condições sanitárias que se vai garantir uma melhor qualidade de vida das populações urbanas.

Todavia, o desenvolvimento continua e a recolha, porta a porta, dos lixos domésticos é um passo gigante para tomar as cidades mais higiénicas e saudáveis; e, a partir daqui, depressa se chega à recolha e seleção de resíduos domésticos e recicláveis com a instalação de contentores coletivos em locais estratégicos de ruas, largos e praças. Mas, como o esforço financeiro que sempre preciso é fazer para a criação e manutenção destes equipamentosblicos por parte das autarquias se torna insuficiente, são os munícipes obrigados, sem apelo nem agravo, a colaborar através do pagamento de impostos, taxas e taxinhas; e a ponto de se chegar a esta situação deveras caricata por absurda: quem mais higiénico e asseado for, isto é quem mais água gastar, mais impostos, taxas e taxinhas vai pagar.

Pois bem, este é, sem dúvida, um preço inevitável e certo a ter de ser pago para custear o desenvolvimento e progresso de vida em sociedade que, no que respeita à nossa barroca, bimilenar, augusta e dos Arcebispos cidade de Braga não foge à regra geral e que bem avantajada nos números e, pior ainda, transforma a leitura das faturas de água num autêntico bicho-de-sete-cabeças, só acessível a inteligências superiores.

Agora, aqui chegados e para se acabar e bem com o espetáculo degradante e deprimente dos sacos de lixo em frente aos prédios, muitas vezes rotos e arrastados rua fora por cães e gatos à procura de alimento ou de espertalhões noturnos que deles fazem bolas de futebol, a Câmara Municipal, através da empresa AGERE coloca contentores pela cidade destinados à recolha seletiva e indiscriminada de resíduos; e, numa primeira fase, fazendo-o, apenas, em zonas abrangentes e só posteriormente servindo todas as ruas do casco urbano.

É, então, que depressa surgem, graças à evolução tecnológica, os denominados contentores ergonómicos que, por definição, são equipamentos adaptados às circunstâncias e necessidades do utilizador, para recolha de todos os lixos domésticos não recicláveis; e, porque de fácil manuseamento para a necessária manobra de recolha dos resíduos pelos competentes funcionários da AGERE e de ainda possuírem a particularidade de serem no local e, no mesmo momento, lavados e desinfetados, estes contentores efetivamente se tornam um bem apetecido de todos os munícipes.

Só que, como não há bela sem senão e os cofres da AGERE não andam assim tão perdulários, estes contentores ergonómicos não chegaram a todos os munícipes das freguesias urbanas, ou seja, em Ferreiros, por exemplo, zonas há que os não possuem e onde se optou pela disseminação dos contentores antigos beco a beco, rua a rua e largo a largo; e como a higienização destes abentesmas não é feita devidamente, nem com a frequência desejada, eles tornam-se malcheirosos e, como tal, uma ameaça à sanidade pública.

Ademais, como estes munícipes, sentindo-se marginalizados ao verem que na sua freguesia existem cidadãos de primeira e cidadãos de segunda, ou seja os tais filhos e enteados e, sobretudo porque pagam como os outros os mesmos impostos, taxas e taxinhas, tal como o famoso sapateiro cá da terra não param de reclamar que ou comem todos haja moralidade e, até, já vão praguejando:

Porra, vai cá uma nortada.

Então até de hoje a oito!


Autor: Dinis Salgado
DM

DM

30 setembro 2020