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Se também soubéssemos parar…

  1. A vida não pára, mas nós devíamos saber parar na vida.

Contudo, desabituamo-nos de parar, de ouvir, de contemplar. O que nos torturou o confinamento! Para nós, agir é estar sempre em movimento.

  1. O «chrónos» que nos domina propende a confundir acção com mera agitação.

E nem sequer percebemos — como percebeu D. António Ferreira Gomes — que a agitação pode pertencer ao mais paralisante da existência. Há, de facto, muita «agitação paralisante» e muita «paralisação agitante».

  1. Um dos segredos do processo educativo — assim se pensava outrora — consistia precisamente em ajudar a parar.

Immanuel Kant defendia que «se mandam as crianças à escola não só para que aprendam alguma coisa, mas para que se habituem a estar calmas e sentadas».

  1. Agora que as casas voltaram a ficar vazias e as ruas cheias, é imperioso que não nos mobilizemos apenas para reproduzir o que sempre se fez.

Nós, cristãos, somos instados a nunca deixar de ouvir «o que o Espírito diz às Igrejas» (Ap 2, 7).

  1. Será que, quando não nos «mexemos», não existimos? Não deveríamos estar atentos ao «kairós» que incessantemente nos interpela? Carlo Maria Martini ousou, no início do século, «propor uma paragem no caminho».

Tratava-se de «uma pausa que nos ajudasse a situar-nos a reencontrar a visão e a retomar fôlego no tempo que atravessamos».

  1. A proposta vinha num texto pastoral com o título «Nossa Senhora de Sábado Santo».

O núcleo radicava no perfil de Maria, certamente a meditar em tudo o que tinha acontecido e na expectativa do que iria acontecer depois.

  1. Nada é dito sobre Ela. Havia certamente um misto nesta atitude dramática e bela: a dor pela morte de Jesus e a esperança na vitória sobre a morte.

A pastoral também se faz de contemplação, de uma paragem que não esteriliza, mas que prepara para grandes cometimentos.

  1. Não consta que Maria Se desmultiplicasse num frenesim arfante. Ela está à escuta e à espera. Sempre com a vontade de Deus a encimar a Sua conduta.

Para Carlo Maria Martini, estamos num novo «sábado do tempo». Encontramo-nos «entre o "já" e o "ainda não", devendo evitar absolutizar o hoje com gestos de triunfalismo, ou, pelo contrário, de derrotismo».

  1. Nesta hora, «não podemos deter-nos na escuridão de Sexta-Feira Santa, numa espécie de "cristianismo sem redenção"».

É certo que os tempos têm um certo sabor a noite, a escuridão.

  1. Mais do que a nostalgia das romarias e das procissões que não poderemos fazer, «vivamos como peregrinos na noite iluminada pela esperança da fé e acalentada pela autenticidade do amor».

Em vez de «fazer», deixemos que o Espírito «faça» em nós, por nós!


Autor: Pe. João António Pinheiro Teixeira
DM

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16 junho 2020